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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Cigana parida na palha espalhada no chão do curral





Cigana parida 
na palha espalhada 
no chão do curral 
mortalha do porco 
e cama do cão.

Poalha de humana caridade 
de meu tio Daniel: 
-Ajuda aqui Inocência 
traz o caçoulo da água benta 
e uma toalha 
que vamos batizá-lo cristão

-Ai Jesus que rapagão 
-Que nome lhe vamos por?


E a cigana Santa ri de alegria 
e um tudo-nada de dor 
- Daniel “comósenhor”! 
Fora mulher e seria Inocência


-Então será Daniel como eu! 
E que bem-dito seja!

E Daniel Comoeu 
cigano livre como o vento 
que vindo de Espanha 
sopra por toda a Montanha 
como eu afilhado 
de minha madrinha Inocência 
e por meu tio Daniel bento 
voa hoje Europa fora 
agora com passaporte 
de crédito e sorte 
derrubando fronteiras uma a uma 
sem raias de ignomínia 
a salto da fortuna.

Rico como porco defunto 
amortalhado na mesma palha 
espalhada no chão do curral 
quando o frio e a geada 
curam o presunto 
curtem coiros e carnes 
e apuram as almas 
deslavadas de mal


In  Minha Pátria Montanha (Ver o Verso Edições – Dezembro 2005). 


6 comentários:

  1. Esta faz-me lembrar uma caldeireira (ou era albardeira?) que bem queria parir nas palhas do chão. do cabanal da minha tia Assunção. Infelizmente não o conseguiu fazer... Fez-se uma subscrição para se arranjar uma camioneta que a levasse ao Hospital. Lá foi na camioneta, Mas no dia seguinte soubémos que tinha morrido sem parir. E o marido caldeireiro (ou albardeiro?) lá seguiu a sua vida pelo mundo com o rancho de filhos que já tinham...
    Nunca me esqueci disto, era eu criança.

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  2. Extraordinário poema. Parabéns!
    Ao fazer a sua leitura vi passar pela minha mente um filme.

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  3. Caro amigo e Poeta Henrique Pedro, li, com gosto, o seu poema. Foi o título que me levou a lê-lo hoje. Os meus avós maternos eram da aldeia de Talhas. Nos seus currais nasceram dezenas de ciganos. A porta estava sempre aberta. Eles batizaram perto de cem crianças a maioria delas ciganas. A minha mãe, batizou 20 crianças ciganas. Ainda andam por lá afilhados deles. Parabéns Cumprimentos.

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  4. Excelente!
    Realidade crua e afecto!
    É por aí que deves explorar a tua poesia: vida e afecto.

    Abraço

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  5. Henrique,
    Adorei! Este foi especial.
    Bj
    Nanda

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  6. Henrique, o título e a imagem a principio me trouxeram aqui, mas o conteúdo este me fez ficar
    poema de inexpressível bom gosto talhado de inteligencia e porque não dizer de uma realidade crua...parabens amigo grande abraço poeta querido beijos na alma

    Rosane Silveira

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