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quarta-feira, 30 de novembro de 2016

Penso que penso só por pensar




Por vezes fico parado
a pensar

A pensar que penso
só por pensar

Alheado
por fora
sem graça
fascinado por dentro

Sem me aperceber
sequer
do vento
que por dentro
me perpassa
vazio de sentimento
nem quente
nem frio

A olhar o vazio
sem me deixar
adormecer
a pensar que penso
só porque penso

Fora de mim nada me diz
dentro de mim nada me digo
o coração nada sente
não há fantasias
nem dilemas na minha mente

Apenas rumino poesias
apenas regurgito poemas

Simplesmente
a pensar que penso
só por pensar




terça-feira, 29 de novembro de 2016

E o meu espírito assim se redime





Sem querer
por vezes me desalento
desanimo
me esvazio de mim
me oco por dentro
caio em crise de fé
e mal me tenho de pé

(E quem
se não eu
se poderá esvaziar de mim?)

Momentos em que a angústia
me assalta a Razão
a ansiedade me toma o coração
e o meu espírito nele próprio se comprime

Já não é dor exterior
que sinto
é sim um sofrimento atroz
interior

Então o maior grito de fé
grito-o em silêncio
porque a maior dor
a sinto por dentro

E o meu espírito assim se redime




segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Não guarde para si a última bala



Não guarde para si
a última bala

A sua derradeira dor
fala
sorriso
beijo
abraço
o último bater do coração

Guarde apenas para si
o seu último poema
a poesia da vida inteira
para declamar perante o Criador

Para que seja Ele a decidir
se é
ou não
merecedor
de continuar a amar
a ler
e a escrever poesia

A dar
e a receber
amor
e a sentir alegria
mesmo depois de morrer



sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Um homem apaixonado




Sou um homem apaixonado
trago a paixão
por perto

Vivo de alma atada ao corpo
pelo sopro do amor
laços de afecto
amarras de ilusão
liames de fantasia

São abraços
beijos
desejos
laivos de poesia

Com que me embaraço
enlaço
e desenlaço

A minha alma voa em seu esplendor
flutua até à Lua
mas não cai
no chão
da rua

Faço das tripas coração



quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Amar nunca é demais




Tanto sonho havemos de sonhar
que acabaremos por transformar
o sonho em realidade

Tanta ilusão havemos de construir
que acabaremos por cair
na realidade

Tanta coisa havemos de comprar
e vender
que acabaremos por aprender
o seu real valor

Tanta mentira havemos de urdir
que prenderemos a discernir
a pertinaz verdade

Tanto havemos de pensar
que acabaremos por ganhar
consciência plena de nós

Tanta guerra havemos de travar
que acabaremos por proclamar
a paz
de viva voz

Tanta dor havemos de sentir
que acabaremos por descobrir
o que nos faz sofrer

E tantas paixões venais
havemos de viver
que aprenderemos a reconhecer
o verdadeiro amor
e que amar
nunca é demais





quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Quando a minha alma em mim anda perdida




A casa vazia
o televisor aceso
sem som
silêncio constrangedor

Um cálice de vinho do Porto
semivazio
meio morto
que não bebo
nem encho
se esvazia
de filosofia
com poesia

Mergulho
mais e mais
na mais amarga solidão

Descubro
com emoção
que existo
quando a minha alma
anda perdida
em mim
e eu não sei que lugar ocupo
no Cosmos

Mas eis que o telefone toca!

É quem me ama que me chama!

Emerjo na piscina da alegria
qual campeão olímpico
ovacionado pela multidão
imagem de caleidoscópio

Agradeço os aplausos

Aplaudo-me a mim próprio



segunda-feira, 21 de novembro de 2016

É na escuridão mais escura que a alma mais luz




Abro o livro
e leio

O meu espírito espevita

Ouço a voz seca de Séneca
que em seu douto pensamento
há séculos
ao vento
grita:
“Deixarás de ter medo quando deixares de ter esperança.”

É a mim que me ouço feito criança
em desassossego

À luz do dia
tomado pelo instinto
tinto de emoção e ilusão
deixo de me ver
e de me ouvir

À luz do dia
de ambição imbuído
a ideia é ruído

No escuro
melhor  me oiço e mais bem vejo
sei o que procuro
e o que desejo

No escuro mais medo sinto 
mais a mente anseia
a esperança renasce
o silêncio é ideia
divino enlace

Abro o livro
e leio
e releio “ A Noite Obscura” de João da Cruz

É na escuridão mais escura
que a alma mais luz

 
Henrique Pedro
Vale de Salgueiro, 3 de Fevereiro de 2008

sábado, 12 de novembro de 2016

A minha versão dos factos



Uma taça de cristal
sem fim
a transbordar
de água cristalina

Ramos de rosas
amorosas
em tálamo nupcial
perfumadas
armadas de espinhos

Se fosse outra
a flor
seria jasmim
da cor da aurora
a perfumar os caminhos

Poesia a florir em mil fractais
a alagar o Cosmos
de espiritualidade
e ais
de angústia
de uma eterna saudade

Ouve-se então
o tropel do coração

Nem anjos
nem deuses
nem diabos
em contrição

Não sabemos o que somos
mas é para anjos que vamos
ao fim e ao cabo
assim apaixonados

Pecamos com virtudes
santificamo-nos com pecados

Esta a minha versão dos factos

Seguramente a mais próxima
da verdade



in Anamnesis (Jan 2016-Ed. Autor)



sexta-feira, 11 de novembro de 2016

Naquela noite o céu pegou fogo




Naquela noite o céu pegou fogo

 

O Universo entrou em guerra

pegou fogo o Céu

enquanto a Terra se cobria

com um véu

de afrodisia

 

Epílogo sagrado do virtuoso amor

dum homem e duma mulher

que em sua fé congraçados

e fiéis ao mandamento

haviam acordado

a virgindade manter

e ambos sofrer

a dor da castidade

até à noite do casamento

 

E assim foi que só depois do matrimónio

terminado o contrato sagrado

e fartos desse seu doce penar

deram por fim liberdade

ao prazeroso jogo

da pulsão da paixão

 

Então o Cosmos entrou em guerra

o Céu pegou fogo

e a Terra se cobriu

com um véu de fantasia

 

Que nenhum anjo ou demónio

ousou apagar

porque tal fogo era o Amor

divinal

aceso no Céu armado no tálamo nupcial

e pelo incendiário abençoado

que é Deus

  

Vale de Salgueiro, terça-feira, 9 de Fevereiro de 2010

Henrique António Pedro


sábado, 5 de novembro de 2016

Não são as lágrimas dos homens que alagam a Terra




Não são as lágrimas dos homens
nem o seu suor
que alagam a Terra
transbordam os rios
e fazem subir o nível do mar

Nem é o seu temor
o bater dos seus corações
que a faz tremer
nem a sua febre
a sua ansiedade
que a faz aquecer
e secar

Tão pouco é o sopro do amor
que levanta ventos e tufões

São a ganância
a arrogância
a insana vaidade
a traição
a exclusão
a insaciável sede de prazer
a vã glória de mandar
o deliro do poder
a vertigem de mentir
a tentação de matar
a loucura da guerra
a febre de competir
que destroem a Terra
e tudo deitam a perder

Já é tempo de parar



sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Arroubos místicos




Arroubos místicos

Muitas vezes me dá para tal
e  não  é só à hora do crepúsculo

É quando menos espero

Dá-me para me abstrair de tudo
tudo misturando num estranho afecto
envolvente de profunda paixão interior
numa só ideia global sem sombra de mal
que mistura eterno e infinito
verdade e santidade

É uma ânsia interior de explodir em amor
uma imparável vontade de bem fazer
um desejo de me libertar
de ser do tamanho do Universo
e
no reverso
humilde e pequenino
como letrinha verso

São arroubos místicos
que não emanam da terra
nem dimanam do céu

Brotam dentro de mim
e são aquilo que sou


in Anamnesis (Janeiro-2016)







quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Célia Flor de Cerejeira





Célia Flor de Cerejeira

 

Ofereci a Célia uma flor de cerejeira pela Primavera

por a achar serena

linda e perfumada como ela

 

A brisa primaveril espalhava pétalas mil pela Natureza

com a mesma delicada leveza

com que o olhar de Célia

o seu sorriso

e o seu odor

se transformam em amor

 

Em breve a meiga cerejeira

que antes se enfeitara de brancas flores

se coroou de cerejas encarnadas

provocantes

luzidias

apetecidos sabores

 

Mas a flor que ofereci a Célia por pura brincadeira

apenas sorriu nos lábios dela

algumas luminosas manhãs

menos tempo que as flores suas irmãs

duraram nos ramos da cerejeira

 

Num ápice as suas pétalas se evolaram

em etéreos beijos

e ternas apalpadelas

 

Tudo não passou de um fugaz amor

de um equívoco de Primavera

que murchou sem frutificar

porque aquela flor não me pertencia

e eu não deveria

tê-la dado à Célia

sem a amar de verdade

 

 

Pertencia sim à cerejeira de onde viera

mesa posta de fruta apetecida agora oferecida pela Primavera

para ser fruída por todos os seres

que se alimentam de desejos

de beijos

de poemas

 e de cerejas

 

 

in “Mulheres de Amor Inventadas”

 

Vale de Salgueiro, 26 de Março de 2008

Henrique António Pedro

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Dulce, paixão adolescente




Hoje deixei a doce Dulce
minha paixão adolescente
impaciente
desleixada
abandonada num banco de jardim

Amanhã  Dulce azedará
irá ficar todo o dia zangada
enciumada
arrufada

Mas depois de amanhã será um outro dia
tudo recomeçará com igual magia
a mesma impaciência
a mesma rebeldia de adolescência

Dir-lhe-ei de novo que a amo
e ela o mesmo a mim me dirá

Era assim, agora me recordo…

Era deslumbrados
com aquela paixão de adolescentes
que sempre retomávamos os jogos inocente s
de beijos e desejos
e inesperados arrufos de namorados

Até que um dia aconteceu
 uma mais adulta impertinência

Paciência

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Levitação






Agora mesmo
como se não houvesse amanhã
nem tivesse havido ontem
nem a hora passada
e vivesse uma eternidade desmemoriada
no presente ausente

Sem um relevante pensamento
um apetite evidente
uma ideia emergente

Na tranquilidade absoluta
de quem não vai nem vem de luta alguma

Sem dar conta do tempo passar
sem um zunido sequer que me possa enervar
fora ou dentro dos ouvidos

Com todos os sentidos a funcionar esplendidamente
tanto que nem eles se dão conta de si
por nada terem que a mim me dizer

De corpo relaxado
e de espírito enlevado
de cérebro todo tomado pela consciência
e a consciência a monitorizar apenas a alma

Sem amor
sem ódio
fantasia ou contrição
tristeza ou alegria
teorema ou dilema
sem motivo de glória ou de frustração
saudade ou nostalgia

Em puro deleite de verdade 
e poesia
com o cordão umbilical bamboleante preso ao presente poema
leve como pluma vogando na bruma
venço a gravidade
entro em levitação

Voo até Deus sem dizer adeus

Vale de Salgueiro, sábado, 5 de Maio de 2012
Henrique Pedro