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sábado, 5 de novembro de 2016

Não são as lágrimas dos homens que alagam a Terra




Não são as lágrimas dos homens
nem o seu suor
que alagam a Terra
transbordam os rios
e fazem subir o nível do mar

Nem é o seu temor
o bater dos seus corações
que a faz tremer
nem a sua febre
a sua ansiedade
que a faz aquecer
e secar

Tão pouco é o sopro do amor
que levanta ventos e tufões

São a ganância
a arrogância
a insana vaidade
a traição
a exclusão
a insaciável sede de prazer
a vã glória de mandar
o deliro do poder
a vertigem de mentir
a tentação de matar
a loucura da guerra
a febre de competir
que destroem a Terra
e tudo deitam a perder

Já é tempo de parar



sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Arroubos místicos




Arroubos místicos

Muitas vezes me dá para tal
e  não  é só à hora do crepúsculo

É quando menos espero

Dá-me para me abstrair de tudo
tudo misturando num estranho afecto
envolvente de profunda paixão interior
numa só ideia global sem sombra de mal
que mistura eterno e infinito
verdade e santidade

É uma ânsia interior de explodir em amor
uma imparável vontade de bem fazer
um desejo de me libertar
de ser do tamanho do Universo
e
no reverso
humilde e pequenino
como letrinha verso

São arroubos místicos
que não emanam da terra
nem dimanam do céu

Brotam dentro de mim
e são aquilo que sou


in Anamnesis (Janeiro-2016)







quinta-feira, 3 de novembro de 2016

Célia Flor de Cerejeira





Célia Flor de Cerejeira

 

Ofereci a Célia uma flor de cerejeira pela Primavera

por a achar serena

linda e perfumada como ela

 

A brisa primaveril espalhava pétalas mil pela Natureza

com a mesma delicada leveza

com que o olhar de Célia

o seu sorriso

e o seu odor

se transformam em amor

 

Em breve a meiga cerejeira

que antes se enfeitara de brancas flores

se coroou de cerejas encarnadas

provocantes

luzidias

apetecidos sabores

 

Mas a flor que ofereci a Célia por pura brincadeira

apenas sorriu nos lábios dela

algumas luminosas manhãs

menos tempo que as flores suas irmãs

duraram nos ramos da cerejeira

 

Num ápice as suas pétalas se evolaram

em etéreos beijos

e ternas apalpadelas

 

Tudo não passou de um fugaz amor

de um equívoco de Primavera

que murchou sem frutificar

porque aquela flor não me pertencia

e eu não deveria

tê-la dado à Célia

sem a amar de verdade

 

 

Pertencia sim à cerejeira de onde viera

mesa posta de fruta apetecida agora oferecida pela Primavera

para ser fruída por todos os seres

que se alimentam de desejos

de beijos

de poemas

 e de cerejas

 

 

in “Mulheres de Amor Inventadas”

 

Vale de Salgueiro, 26 de Março de 2008

Henrique António Pedro

quarta-feira, 2 de novembro de 2016

Dulce, paixão adolescente




Hoje deixei a doce Dulce
minha paixão adolescente
impaciente
desleixada
abandonada num banco de jardim

Amanhã  Dulce azedará
irá ficar todo o dia zangada
enciumada
arrufada

Mas depois de amanhã será um outro dia
tudo recomeçará com igual magia
a mesma impaciência
a mesma rebeldia de adolescência

Dir-lhe-ei de novo que a amo
e ela o mesmo a mim me dirá

Era assim, agora me recordo…

Era deslumbrados
com aquela paixão de adolescentes
que sempre retomávamos os jogos inocente s
de beijos e desejos
e inesperados arrufos de namorados

Até que um dia aconteceu
 uma mais adulta impertinência

Paciência

terça-feira, 1 de novembro de 2016

Levitação






Agora mesmo
como se não houvesse amanhã
nem tivesse havido ontem
nem a hora passada
e vivesse uma eternidade desmemoriada
no presente ausente

Sem um relevante pensamento
um apetite evidente
uma ideia emergente

Na tranquilidade absoluta
de quem não vai nem vem de luta alguma

Sem dar conta do tempo passar
sem um zunido sequer que me possa enervar
fora ou dentro dos ouvidos

Com todos os sentidos a funcionar esplendidamente
tanto que nem eles se dão conta de si
por nada terem que a mim me dizer

De corpo relaxado
e de espírito enlevado
de cérebro todo tomado pela consciência
e a consciência a monitorizar apenas a alma

Sem amor
sem ódio
fantasia ou contrição
tristeza ou alegria
teorema ou dilema
sem motivo de glória ou de frustração
saudade ou nostalgia

Em puro deleite de verdade 
e poesia
com o cordão umbilical bamboleante preso ao presente poema
leve como pluma vogando na bruma
venço a gravidade
entro em levitação

Voo até Deus sem dizer adeus

Vale de Salgueiro, sábado, 5 de Maio de 2012
Henrique Pedro