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sábado, 11 de fevereiro de 2017

Grito!



Consola-me constatar
que mesmo no escuro
consigo sentir

E pensar

Aprisionado nas frias masmorras da dúvida
e da angústia
onde apenas entra alguma luz
difusa
pelos olhos
e alguns sons
estereofónicos
pelos ouvidos
sinto-me amarrado a tudo que transporto comigo
e de nada me valem músculos e membros

Desesperado
agarro-me às grades e grito
no silêncio

Grito pelo carcereiro
na esperança de me fazer ouvir no universo inteiro
e de que alguém me virá libertar

Mas apenas ouço os meus gritos ecoar
e ressoar
dentro de mim
como em poço sem fundo

Porque é em mim que estou preso
numa prisão do tamanho do mundo

Apesar de tudo
consola-me constatar
que mesmo mudo
consigo gritar



segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Um poema e dois dedos de angústia





Ando angustiado
por tudo
e por nada
embora esteja certo de não ser demente
nem estar doente
ou andar enamorado

Sinto-me sem valor
nulo
inseguro
com medo de tudo

Fico quedo
enfadado
tomado de desconhecido temor

Angustia-me o futuro
amargura-me o passado

Se tento não me angustiar
uma maior angústia larvar
acaba por se impor
contrária ao meu querer

Tem tudo a ver
com este mundo malvado



quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

A quantos a quem amei embora não tanto quanto devia





A quantos a quem amei embora não tanto quanto devia

 

São boas recordações ainda assim

embora me mortificam e desalentem

porque o tempo e o vento as transformam em saudade, soledade e nostalgia

e me deixam aborrido

ferido

sem alegria

à procura de novo sentido para a vida ainda não vivida

 

A quantos a quem amei embora não tanto quanto devia

 

A mesma saudade que, contudo, se transmuta em apelo do futuro

em fé no devir

em razão de ser e sorrir

por força de quantos não amei tanto quanto devia ter amado

e de tudo que não vivi

 

Ainda estou em tempo de remir ainda assim

 

A quantos a quem amei embora não tanto quanto devia

mas ainda assim poderei mais amar

com redobrada soledade e nostalgia

 

A quantos a quem amei embora não tanto quanto devia

esta elegia da saudade

 

Vale de Salgueiro, sexta-feira, 27 de Novembro de 2009

Henrique António Pedro


terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Luar




Passo um braço pelos seus ombros com doçura
e ela abraça-me pela cintura

Assim abraçados
e para Sul voltados
as nossas silhuetas recortam-se no luar
sob a abóbada celeste azul
cintilante
marchetada de estrelas
em incessante bruxulear

Diz-me que gostaria de viajar
até à estrela mais distante
a mim assim abraçada
e pergunta-me em que penso eu

Penso numa estrela mais próxima
cujo coração sinto cintilar
aqui
junto a mim
penso em ti
respondo
inebriado de paixão

A noite ilumina-se com o seu sorriso
abraçamo-nos ainda mais forte
voltados agora um para o outro
cada um para o seu norte
recortando o nosso amor
no luar



sábado, 28 de janeiro de 2017

Um poema e um prato de feijão



 

Gosto de ler e declamar poesia

soneto

odisseia

uma simples quadra que seja

que comporte alegria

e uma ideia imaculada

 

Como gosto de feijoada à brasileira

ou à moda transmontana

embora aceite que não é comida ligeira

sobretudo se comida à fartazana

 

Embora também haja poesia que mete dó

e humanos que fazem doer o coração

porque morrem à míngua, tão só

por não terem um prato de feijão para comer

e muito menos um simples poema saibam ler

 

Não estou certo, porém

nem de longe nem de perto

que basta ler um poema e comer um prato de feijão

para se alcançar a Salvação

 

Mas estou em crer com verdade

que um poema e uma feijoada

confecionados com amor  e com arte

ou um simples naco de pão

resolveriam em grande parte

os problemas da Humanidade

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 18 de Março de 2009

Henrique António Pedro