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quinta-feira, 23 de agosto de 2018

Crónicas Secretas do Afeganistão V Levanta-se uma ponta do véu






V

Levanta-se uma ponta do véu

Descobri
Aqui
Por minha conta
E risco
Nesta terra de insana cultura muçulmana
Que a parte mais sensual
Do corpo de uma mulher
É o rosto
Sobretudo se sorri
Depois do sol-posto

E que dentro do rosto são os olhos
E a forma de olhar
Depois os lábios
Mesmo antes de beijar

Com o olhar a mulher se desnuda
Quando ela quer
Perante a nossa vista
E convida a que também se dispa
Quem a vê
Sem necessidade de se esconder

Depois com os lábios sopra os desejos
Que lhe interessa atear
Que são difíceis de apagar

Levantou para mim
Só uma ponta do véu
E eu
Subi ao céu

Não vi um diabo
Vi um anjo endiabrado
Que para mim tocava
Violino e banjo

Corri o risco de ali mesmo
Me imolar
E ao inferno na terra
Ir parar


Afeganistão, Ponto GPS Vénus, 30082005
Daniel Rio Livre
(Repórter de guerra imaginário)



Apostila:
De novo em Cabul, de volta às entusiasmantes operações clandestinas. Disfarçado de mulher muçulmana com uma burca confortável e na companhia da fantástica agente turca, desloquei-me, quando já o Sol se recolhia no horizonte, a uma casa agradável situada num bairro arejado e moderno da cidade. Para um encontro com uma associação clandestina de mulheres que lutam, heroicamente, pelos seus direitos. Acabámos por ali pernoitar em segredo. Mas a nota mais estonteante registei-a quando a anfitriã, depois de me olhar por entre o quadriculado que lhe encobria o rosto, levantou uma ponta do véu, para que eu a visse. 
Interessante como nas culturas de raiz muçulmana o rosto da mulher muçulmana se resguarda, para não ser partilhado e porque poderá ser fautor de tentação, enquanto nas culturas de raiz cristã se destapa para que seja apreciado e a face de um anjo se afirme. Acabei por passar a noite em permanente sobressalto, sempre de arma aperrada ao alcance da mão.