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sábado, 21 de julho de 2018

UM LIVRO ABERTO NO DESERTO VII - A mulher da burca celeste




Imagino o céu de Sherezade
Reflectido no lago do oásis
E fico a sonhar
Como será na verdade
O encanto do seu olhar

Fito o Sol de frente na alvorada
No ocaso e ao meio dia
Corro o risco de cegar
Para tentar perceber
Que cor é a dos seus cabelos

Pressinto na Lua prateada
A tez da sua pele nua
Sem conseguir tacteá-la

Inebrio-me com a fantasia
De sorver na doçura das tâmaras maduras
A formosura dos seus seios

Dela me acerco
Tentando inalar o seu perfume
Corro o risco de morrer
Às mãos dos guardas do sultão

Enlaço com ternura a dócil gazela
Que passeia na cerca do seu jardim
Imaginando a graciosidade do seu porte
Mas ela foge de mim
Espavorida
Sem rumo ou norte

Como posso estar certo de que me sorri
Se a burca de seda celeste
Que lhe tapa o rosto
Também lhe cobre todo o corpo
E o seu sorriso não tem som?


Resta-me ler o tom do seu pensamento
No esvoaçar do véu
Que a sua mão levanta ao vento do céu
E fico esperando que por fim
Para minha gloriosa felicidade
Amorosa se dispa para mim

Ela mesma se libertará da burca terrena
E serena me apontará
O caminho da eternidade.

Algures no Deserto do Sahara)
 xiii-viii-mmix


sexta-feira, 20 de julho de 2018

UM LIVRO ABERTO NO DESERTO VI – Mil saudades e uma só solidão




Areia!

Montanhas de areia me envolvem
Trazidas pelo vento suão
Cobrem-me e descobrem-me
De mil saudades e de uma só solidão

Nada vivo se vê por aqui!
Uma ave
Uma flor
Um réptil
Um roedor
Um insecto que seja
Apenas a morte tenta sua sorte

Dentro mim, Huri
Ardeja um amor mais forte
A Estrela Polar brilha mais a norte
És tu que ma chamas em surdina

Essa luz pequenina
Que bruxuleia no Firmamento
Batida pelo vento
É a chama da fogueira saudade
Que arde e nos queima
A ti e a mim

Só assim me mantenho vivo
E sobrevivo
Ao frio
À fome
À sede
Ao calor abrasador
À saudade
E à má sorte
Neste império da morte

(Algures no Deserto do Sahara)
 i-v-mmix


quinta-feira, 19 de julho de 2018

UM LIVRO ABERTO NO DESERTO V - Soldado de fortuna



Obscuro soldado da fortuna
No verbo e no verso breve
Salta de noite
No escuro
E desce planando
Leve
Como pluma

Nada saber de ninguém
Nem de si
É seu fadário

Ninguém pergunta a um mercenário
Seja lá o que for
Ou o que tiver sido
Apenas se lhe pede que se mantenha de pé
Mesmo se vencido

Apenas se questiona o seu valor
No campo de batalha 
Que poderá bem ser
A sua mortalha

Rasga a atmosfera
Célere
Enquanto cogita

A Terra o espera
A loucura o toma
Grita de dor

Voga no plano astral

Apenas reentra no Universo
E recupera a sanidade mental
Se escreve
Versos de amor

(Algures no Deserto do Sahara)
 xxx-iv-mmix


terça-feira, 17 de julho de 2018

UM LIVRO ABERTO NO DESERTO IV - Dança na minha mente a dança do ventre




Dança na minha mente
A dança do ventre
Huri

Amanhã entro em combate
Já o coração me bate
A rebate

Como os sinos da nossa aldeia
Que tocam a sinais
Tinindo dores e ais
Sempre que alguém morre
Quando quem vive
Embora só na ideia
É quem mais sofre

Porque te chamo eu, assim, de Huri
Se não és muçulmana
E nenhum profeta
De ti me fez presente
Estando eu ausente?

És transmontana linda
Ridente
Como a romã
Que pela manhã sorri
Com mil dentes de diamante

Amanhã entro em combate
Já o coração me bate
A rebate
Dança na minha mente
A dança do ventre
Huri

É o teu útero que eu quero ter
Para em ti renascer 
Se acaso morrer

Não neste deserto
Antes nesse oásis daí
De ti
Bem mais perto

(Algures no Deserto do Sahara)
 xxvix-iv-mmix


segunda-feira, 16 de julho de 2018

UM LIVRO ABERTO NO DESERTO III - Miragem





Um mar de areia nos envolve
Em toda a jornada

O calor sufoca

Dunas
Mais dunas
Mais nada

Depois a sede
Adrede
Ardente
O suor
O estertor

Água!
Os meus lábios febris
Pedem água

Vejo oceanos além
Além
E além

E a imagem meiga de minha mãe
A acenar

Apetece-me correr
Saltar
Para a abraçar
E me dessedentar

Sou eu que sigo na dianteira
E se algum cair
Terei que parar o levantar
Não posso desistir

Se eu desisto
Outros desistem 
E todos acabamos por perecer


(Algures no Deserto do Sahara)
 xxix-iv-mmix


domingo, 15 de julho de 2018

LIVRO ABERTO NO DESERTO II - Minha doce huri






A minha cabeça pende
A meio da vigília
Vencida pelo sono e pelo cansaço
És tu, minha doce huri
Quem a afaga
E a reclina no seu regaço

És tu que te deitas a meu lado
Desnuda
Em sonhos súcubos
De airoso encantamento

Ouço o teu chamamento mavioso 
A pedir-me que regresse à Pátria
Onde me esperam os teus braços
E fico saudoso

Desperto
Neste deserto sem fim
Sem te encontrar

Não huri
Não pode ser assim
Prefiro morrer
Morrer por ti
Aqui

Foi aqui que eu vim
Te procurar


(Algures no Deserto do Sahara)
 xxviii-iv-mmix