Quem sou eu, afinal
Sou um Cartão de
Cidadão
um alarde Citizen Card
duma púdica República
chamada Portugal
A fotografia tosca de
um rosto
sem sorriso
que não retrata um coração
dorido
Um nome e um apelido
nada mais
uma referência a meus pais
Um Número de Identificação
Fiscal
outro de Contribuinte
que não teria se eu
fora pedinte
Sou uma letrinha
pequenina
sem nexo que identifica
o sexo
que grande imbróglio
ó Portugal glorioso!
Sou o que meço de altura
omitindo a minha
postura
Sou um número de
utente
do Serviço Nacional
de Saúde
outro da Segurança
Social
demente e sem
virtude
sou o local onde moro
é demais
Sou um cidadão numerado
marcado
de impostos pagador
eleitor de algum
político impostor
Sou bites e bytes de
uma Base de Dados
destinados a serem
manipulados
partilhados
repartidos
abatidos
a bem ou mal
ditames do Orçamento
de Estado
ou da Segurança
Nacional
Não sou ninguém nem
nada
em última análise
herói sequer de
banda desenhada
catarse do que não quero
esquecer
sem que saiba bem porquê
Sou esta angústia de
não saber
aquilo que gostaria
de ser
mas não um número já
se vê!
Vale de Salgueiro, quarta-feira,
28 de Abril de 2010
Henrique António Pedro