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sábado, 15 de outubro de 2016

Silvas e Roseiras em Flor




Silvas

daninhas

marginais

floridas de florinhas pequeninas

suavemente coloridas

emolduram os muros

que marginam

os caminhos

rurais

 

Espinhosas

como as rosas

que são mais vistosas

nos canteiros

dos quintais

 

As silvas dão amoras

saborosas

enquanto as rosas

de pendor mais romântico

se esvanecem em perfume

e cor

enigmático cântico

de dor

amor 

e ciúme

 

Silvas e roseiras

ambas espinhosas

ambas em flor

o mesmo hino

sibilino

de louvor

ao Criador

 

Vale de Salgueiro, sábado, 12 de Junho de 2010

Henrique António Pedro


 

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Dando tempo ao tempo




Apercebo-me de um mais débil pulsar
de badalas langorosas de cansaço
corro a dar corda aos meus relógios
para assim os espevitar
não vão eles parar
e com eles parar o tempo

Iludo-me…

Pensando que o tempo sou eu que faço
mas o tempo não tem origem em mim
apenas o mais puro sentimento
me vem de dentro

Ainda assim...

Como os maquinismos mecânicos
prolongam as horas e os dias
dos mecanismos do tempo
em badaladas mais sonoras
e prolongadas

Também…

Os beijos e os afagos
animam o bater dos corações
e reanimam
com seu calor
as maquinações da relojoaria do amor
e dão mais tempo
ao tempo

Mas o tempo…

Sempre está a acontecer
esgota-se por si só
com dor e desdém
sem dó nem piedade
e tudo acaba por morrer
deverdade

A menos que a mecânica celeste
com sua engrenagem cor-de-rosa
nos conduza em viagem
mais esperançosa
no além


segunda-feira, 3 de outubro de 2016

E se os humanos fossem pássaros?




Esta recomendação faço com emoção
ao Criador

Se acaso entender corrigir a Criação
então
que faça dos humanos
desta vez
aves

Que os coloque de novo sobre as árvores donde desceram
(Como defendem os evolucionistas)
mas que não permita que agora as deixem
jamais

Que fiquem por lá para sempre
ganhem penas e asas que os habilitem a voar
como as pombas, os pintassilgos ou os pardais

E que voem aos pares pela Primavera
que se amem com arrulhos
a saltar de ramo em ramo
a chilrear
bastando uma amorosa bicada
em pleno ar
para o homem–pássaro galar a mulher-ave
e a engravidar


Que por lá construem seus ninhos
nos quais a nulher-ave porá os seus ovinhos
que chocará com seu calor maternal
até que a casca quebrar e soltar os meninos-passarinhos
que só abandonarão o ninho
quando souberem voar



Será assim mais fácil lançar-se o homem na exploração espacial
não terá necessidade de construir aeroportos
auto-estradas
arranha-céus
nem de transformar o planeta Terra
num cometa

Porque tudo
ou quase tudo
desde o nascer, ao amar, ao morrer
se passará como com as aves

No ar


Vale de Salgueiro, segunda-feira, 27 de Abril de 2009
Henrique Pedro




domingo, 2 de outubro de 2016

Poema erudito




É ideia deste poema nada dizer
a ninguém
não obstante quem o ler
seja livre de o interpretar
como lhe aprouver
e melhor lhe convém

Pretende ser um poema erudito
não há como o contornar
embora o léxico não seja académico
muito menos jargão
não disseque a alma de ninguém
não verbere o acordo ortográfico
nem diga mal de nada
ou fique de boca calada

Embora seja assintomático
não respeita o modismo endémico
não segue corrente literária
muito menos política agrária
nem é escrito à mesa de café

Pode muito bem ser, porém
declamado
e aplaudido de pé
até
como tantos da sua igualha
de muito  poeta consagrado

Este poema é erudito
sim
mesmo sendo ruim
não fala de coisa nenhuma
nem diz coisa com coisa

Quem o ler
nada ficará a saber
embora fique a pensar
e sabe-se lá o quê…
…de mim

terça-feira, 27 de setembro de 2016

Se assim bate o seu coração



Se o seu coração bate
assim
forte
a saltar fora do peito
feito cavalo à solta
é porque anda insatisfeito

Se o seu bater é de tambor
a rufar de dor
é angustura
que mal se atura

Se bate o coração
sem que se sinta bater
enquanto a mente pensa
com indiferença
e os olhos
olham
sem ver
é de desilusão
o seu bater

Se o coração bate
assim
forte
sem que se sinta bater
e o espírito voa
com alegria
leve
e livre
com poesia…

… é amor
nada o poderá deter

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Aquela paixão não passou de um poema escrito num pedaço de papel que ardeu






Escrevi aquele poema na minha própria alma
com a tinta doirada do meu amor
e com toda a minha arte
na esperança de que ela o lesse com o coração

Ela porém tomou-o por burlesco
por literatura de cordel

Pediu-me que o anotasse num pedaço de papel
que não leu
e que depois de amassado
acabou cremado
em fugaz incêndio
num cinzeiro grosseiro
de vidro vulgar

Sobrou um montículo de cinza
que com um sopro
leve
e um despiciendo piparote
sacudiu do capote

Não tem porque se lamentar
agora
que anda perdida
a esmo
lamentando-se de me não ter dado a devida atenção

Aquela paixão
indevida
não passou disso mesmo

De um poema escrito num pedaço de papel
que ardeu
só porque ela não o mereceu



segunda-feira, 5 de setembro de 2016

Quando a poesia acontece mesmo sem inspiração.




Já a Primavera se transmuda em Verão

Já o Sol se põe
e muda de posição
deixando atrás de si
um resplendor alaranjado
que se desvanece
e me deixa extasiado
enquanto o céu escurece
e a Terra se encobre de escuridão

Já a Lua brilha cristalina
já se acende a estrela  vespertina
depois outra após outra
marchetando o Firmamento
que por fim se ilumina
de cerúleo polimento
mais abrangente

Nenhuma ideia brilhante
nenhuma palavra redundante
uma rima sequer
indiciam poemas na minha mente

Nem eu tristonho
me predisponho a poetar
assim mergulhado na soledade
do fim do dia
extasiado com a serenidade
da contemplação

Sob o olhar da Lua
que em silêncio percorre o céu
e me olha
como se estivesse ali postada
ela sim
para a mim
me contemplar
e cobrir com o seu véu

Mas eu não tenho dilemas
penas para espiar
ninguém para namorar
nada de poemas
um verso que seja para escrever

apenas solidão

Nada à Lua posso dar

nada a Lua me oferece
à Lua nada pedi

A poesia acontece
por si
mesmo sem inspiração





sexta-feira, 26 de agosto de 2016

Com poesia a mim mesmo me engano



Confidencia-me o seu segredo mais íntimo
que silencio nos ouvidos
e sepulto no coração

Ouso ir mais além
porém

Codificar o segredo em poema
e lançá-lo ao vento
também

Ficará bem melhor guardado
ainda assim
por todo o tempo

Porque a poesia é a arte de enganar
com a verdade
de esconder tristeza com alegria
de disfarçar com amizade
a paixão

Por isso as palavras me saem da mente
agora
em torrente
sem chama
nem drama
nem razão

Concertadas em poema depenado
cujas pétalas perfumam o chão
agridoce
dessa doce intimidade
com que ela me desengana
sem me causar maior dano

Na verdade
sou eu
que com poesia
a mim mesmo me engano

quarta-feira, 24 de agosto de 2016

Poente




Caminho
recto
na direcção poente

De cabeça baixa
porque o Sol não me deixa que o olhe de frente

Sol que me aquece o corpo
me doira a pele
me energiza a alma
em tarde calma
quando ainda o horizonte s afasta de mim
se transfigura
volátil
e surge sempre mais além

Só no exacto momento em que o Sol se esconde
o consigo ver
transformado em arco resplandecente
que rápido se dilui em poalha de luz
morno calor
que me induz
a parar

Fico a pensar
extasiado
iluminado
pelo halo de amor
que persiste
dentro de mim

sexta-feira, 22 de julho de 2016

Amor e ubiquidade







Diz-me
para me consolar
e iludir a minha saudade
que embora ausente
no seu coração estou sempre presente

Que sou omnipresente
vá para onde ela for
esteja eu onde estiver

Mas eu
dela distante
ando inclinado
oblíquo
sem a poder esquecer

Sou um viandante
sempre ausente

um desertor
“omniausente”
livre mas enjaulado

Gostaria antes de ser ubíquo
de poder estar lá
e aqui
ao mesmo tempo
em todo o lado

Vê-la
e tê-la
a ela
sempre abraçado

Amor
na verdade
é ubiquidade


terça-feira, 19 de julho de 2016

Ouvindo o silêncio em solidão



Dá-me prazer ouvir
o silêncio
em solidão

Prazer que advém da alegria interior
de procurar companhia
mais além
fora do mundo
e do tempo

De ouvir em meus ouvidos
o ruído que traz o vento
do cosmos profundo

De o sentir em todos os sentidos
e de o calar
bem fundo
dentro de mim
para aí o interpretar

Fora da razão
ainda assim

terça-feira, 5 de julho de 2016

O beijo de uma flor



É uma glória pequenina

maior que a minha vaidade

ainda assim

uma infinita felicidade

o ser beijado por uma flor

 

De ser aspergido com seu pó de pólen

perfumado do seu odor

ficar para sempre enamorado

e ligado

a esta alegre

embora breve

glória

 

História ínfima

efémera

ébria de candura

instante eterno

que não perdura

 

Momento superno

de desejo

e de amor

é o beijo terno

de uma flor


Vale de Salgueiro, sábado, 24 de Novembro de 2012

Henrique Pedro


terça-feira, 14 de junho de 2016

O lugar de Deus está vago e a concurso




Quem não sentiu já
um vácuo na alma
um vazio no coração?

Porque perdeu um ente querido

chegou ao fim uma paixão
caiu no olvido
de alguém

porque não se encontra
ou sofreu uma grande desilusão

Ou por mera angústia constitucional

E quantos não ocuparam esse espaço vazio
com sarcasmo
riso idiota
obscenidade
álcool
droga
raiva
revolta
ódio
agressividade?

Pois é…

mas o vazio continua lá
em aberto

a doer e a causar dor
sendo certo que só o amor
de verdade

o poderá preencher
porque esse é o lugar de Deus

Lugar que está vago

e a concurso

e a ele concorrem

todas a forças do mal

quinta-feira, 9 de junho de 2016

Deu-me a provar o seu corpo




Trazia fogo no ventre
os seus seios ardiam
e os seus lábios queimavam
ainda mais que os meus

Envolveu-nos o vento da paixão
que nos obscureceu a Razão

Deu-me a provar o seu corpo
para sentir o sabor do meu

Sem saber bem o que fazia
já que nem o seu
nem o meu coração
reconhecia
nem eu sabia nada de mim

Acabámos por saborear
na verdade
o que apenas era suposto provar

Tanto assim que acordámos aprovar
e apalavrar
a palavra amor
para uma próxima oportunidade

sexta-feira, 29 de abril de 2016

Um sopro divino




Há um sopro divino
que dentro de mim sopra
sem parar
e sem tino

Que procuro entender
e diferenciar

Sopro que me vai na alma
e não me vem do corpo

E me leva a poetar
como forma de me libertar

Uma sensação estranha
de me sentir preso
à sanha do desejo
ensejo de me soltar

De querer ser
como a luz das estrelas
que depois do astro morrer
continua a brilhar

Pura poesia
quando o estro se finar
e se perder no vento

Vontade de viver
fora do espaço-tempo

sábado, 23 de abril de 2016

Poema acabado de florir com a Primavera



O vento arrasta a chuva por mim a dentro
em bátegas de impaciência

Mergulho numa aborrida dormência

Procuro sinónimos de mim e de Primavera
a mais bizarra sinonímia que posso imaginar

Sou um novelo de liberdade
em que me enredo e emaranho
quando apenas pretendia me libertar

Um emaranhado de amor
de tanto amar

Uma nuvem negra de angústia
uma borbulha de ansiedade
um cachão de raiva
um furúnculo de repulsa
um borboto de lixo
uma ampola de azia
um balão de demência
um poço de loucura
uma câmara de tortura
uma catedral vazia

Acordo

Havia adormecido

sem me ter apercebido

nem dar pelo tempo passar

já há sol a fulgir

lá fora

à minha espera


Sorrio

agora

dentro de mim

há um botão de flor a desabrochar

um poema acabado de florir ao romper da Primavera

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 29 de Março de 2010

Henrique Pedro