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segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Cinderela


Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que gritava meu amor ao vento

Em jeito de lamento

Por dele não ousar falar a ninguém

Nem mesmo a ela

 

Respondia-me o eco

Repetitivo como um sino

Badalando o meu amor

Sem tino

Por montes e vales

Atribuindo ao meu triste destino

A origem dos meus males

 

Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que desenhava o meu amor na areia húmida

Da praia deserta

Feito criança

Na esperança de que lhe seria levado pelas aves

 

Mas vinham as ondas Uma a uma

Apagar os riscos fugazes

Devagarinho

E cobri-los com a sua própria espuma

 

Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que gravei o meu amor bem fundo

No tronco de um plátano secular

Certo de que a árvore confidente

Iria guardar o segredo para sempre

 

E ainda hoje quando por lá passo

Recordo atónito

Esse amor platónico

Afago a palavra “amo-te”

Gravada no tronco prateado

Dentro de um coração trespassado

Para enxugar as lágrimas de seiva

Que o plátano continua a chorar

 

E ouço o mesmo vento que me responde

Tangendo na ramagem silenciosa

Esta sinfonia chorosa

Sibilante de dor apesar do tempo

“Era no coração da bela cinderela que deverias ter gravado o teu amor”

 

Vale de Salgueiro, 2 de Janeiro de 2008

Henrique António Pedro

 

in Mulheres de Amor Inventadas

Copyright © Henrique Pedro (prosaYpoesia) 

1.ª Edição, Outubro de 2013


sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

À lareira

 



Fito a lareira acesa

com o coração ao fogo exposto

as labaredas lambem-me o rosto

com seu morno calor

 

São raízes que ardem

e me aquecem sem me queimar

lembranças de amantes

que me enlaçam

inebriantes

e uma após outra me vêm

beijar

 

Labaredas de lembranças

quimeras de amor

que aparecem

e me aquecem

mas logo se esquecem

fugaz fulgor

 

Estendo-lhes a mão por elas iluminada

ainda assim

sem dilema

para as acariciar

 

Guardo para mim este poema

cinza prateada de recordação

 

Vale de Salgueiro, Quinta-feira, 20 de Dezembro de 2012

Henrique António Pedro


segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Porque te amo, eu?!

 


Porque a luz do teu olhar

Me ilumina

Por dentro

 

Porque o sopro do teu respirar

Me inebria

E me dá alento

 

Porque o toque da tua mão

Me arrepia

E me acelera o coração

 

Porque a tua voz me desperta

O teu perfume me incendeia

O teu espírito me cativa

E me liberta

 

Porque és a mulher que mais me diz

E que mais de si me dá

 

Só por isto eu te amo

Ainda que sem que eu saiba

Haja uma divina razão

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 29 de Dezembro de 2009

Henrique António Pedro

sábado, 1 de janeiro de 2022

O mundo acabará no dia em que eu morrer


No dia em que eu morrer apagar-se-ão todas as luzes da Terra

e todas as estrelas do céu

o Sol pôr-se-á para não mais nascer

porque os meus olhos fechados nada mais poderão ver

 

O mundo acabará nesse dia

para mim

 

Quando eu morrer calar-se-ão os todos os canhões

os corações deixarão de bater

os meus ouvidos silenciados

tão pouco o cântico das aves poderão ouvir

 

Deixará de haver tempestades na terra e no mar

cães a latir

crianças a chorar

as flores deixarão de perfumar o ar

e de colorir os campos

porque eu não estarei lá para os apreciar e sentir

 

Todas as lembranças de criança

sonhos de glória

a história da minha vida sentida

se apagarão da memória nesse dia

 

O mundo cobrir-se-á de um manto de tristeza

sem sentido

porque morrerei sem ter sido tido nem achado

e embora viva apaixonado

ainda hoje não sei porque nasci

e também não saberei

porque morri

 

Resta-me contudo a esperança

a fugaz alegria

de que o mundo não se acabará para mim no dia em que eu morrer

se uma só boa pessoa continuar a ler

a minha poesia

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 5 de dezembro de 2017

Henrique António Pedro



terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Dessa mulher nada quero saber

 


Não quero saber quem é

nem o que faz

ou que fez

 

É-me indiferente

 

Completamente

 

Não me importa saber se é bonita

catita

feia

fantasma

sereia

inteligente

indigente

morena

liberal

grande

pequena

sensual

bailarina

nórdica, arábica ou latina

 

Duvido até que é disléxica, estrábica e daltónica

porque mal me vê

e nem me fala

 

Sobre essa mulher

não me interrogo

 

Quero lá saber!

 

Apenas me questiono

porque será que só de a ver

me emociono

 

Dessa mulher nada quero saber

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 27 de Fevereiro de 2012

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 10 de dezembro de 2021

Olho-me nos olhos


Olho-me nos olhos

in Anamnesis( 1.ª Edição: Janeiro de 2016) 

 

Vejo-me ao espelho

olho-me nos olhos

 

Vejo um sujeito que não sou eu

que não conheço

e que me espanta

 

Não é o meu eu interior

poético ou lírico

que vive de amor

que ali se reflecte

 

É um crâneo calvo

um rosto rugado

um olhar cismado

que nada me dizem de mim

 

E eu

a toda a hora me olho

e me vejo por dentro

faça sol, chuva ou vento

noite e dia

a dormir ou acordado

em tristeza ou alegria

 

E sempre me vejo

com verdade

embora envolto em sonho

e ansiedade

 

Fico

por isso

espantado

por ver-me assim retratado

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 2 de Março de 2011

Henrique António Pedro

 


quinta-feira, 18 de novembro de 2021

AMAR E SOFRER



Tantas vezes nos enganamos

julgando que amamos

só porque sentimos prazer

que o próprio amor

acabamos por perder

o que ainda mais nos faz doer

 

É sofrendo

e amando

que o amor se vai firmando

e vencendo

a dor

 

Para sofrer

bastamo-nos a nós

não precisamos de nada nem de ninguém

e mais sofremos

sós

 

Para amar

porém

precisamos de algo

ou de alguém

 

Vale de Salgueiro, 4 de Fevereiro de 2008

Henrique António Pedro


terça-feira, 9 de novembro de 2021

Com quem amo me encanto


Amar de alma

ou de coração

é admirar

é admiração

 

Eu admiro quem amo

com quem amo me encanto

me dá contentamento

 

Eu admiro quem amo

quem amo me causa espanto

 

Amo também

de quem

tenho dó

com seu sofrimento me condo-o

 

Só de ver alguém sofrer

a mim mesmo eu me doo

a paixão por compaixão

dói por fora

e dói por dentro

 

Amar

é tão só bem-querer

admirar

encantamento

 

Vale de Salgueiro, sábado, 10 de Abril de 2010

Henrique António Pedro

 

 

sexta-feira, 22 de outubro de 2021

Felizidade


Vista do lado de fora

a felicidade

chama-se alegria

 

Por dentro é contentamento

 

Vê-se num olhar

num sorriso

num abraço

num aperto de mão

no bater do coração

num balbuciar impreciso

numa efémera manifestação de gozo

numa imperceptível expressão facial

 

Até numa lágrima

num embaraço amoroso

numa atitude de virtude

feita de fé e fantasia

num arrebatamento espiritual

 

Muitos a procuram

nos bares e nos estádios

noticiada nalgum jornal

 

Outros no sossego do lar

na religiosidade de um templo

até na aspereza da Natureza

também

 

Poderá andar por aí, sim

mas não é aí que a felicidade mora

na verdade

 

Só dentro de nós ela vive

porém

em qualquer fugaz Feliz Idade

  

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 27 de Agosto de 2008

Henrique António Pedro


 

terça-feira, 19 de outubro de 2021

Tantas coisas sem tino a vida tem!


Tantas coisas sem tino a vida tem!

 

Todas têm destino

porém

 

Na paz ou na guerra

cá na Terra ou lá nos céus

sobretudo a morte

meu Deus!

 

Os golpes de má sorte

a dor que não acaba

a felicidade adiada

ou a paixão que chega ao fim

parecem não ter sentido

nem valerem de nada

qual vozes que o vento leva

 

Mas será que é assim?

 

A lembrança delével que o tempo releva

e na memória se tolda

poderá bem ser a transformação indelével

que nos molda

definitivamente

 

Tantas coisas sem tino a vida tem!

 

Perceberemos com o tempo

porém

que tudo o que fica dentro nós

para sempre

tudo levamos para o Além

certamente

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 24 de Outubro de 2011

Henrique António Pedro

 

domingo, 3 de outubro de 2021

Quando é a alma que nos dói

 



O corpo

quando nos dói

dói-nos por partes

nunca nos dói todo

inteiro

apenas em parte nos dói

 

Dói-nos um pé

uma mão

o peito

o coração

cada um com sua dor

 

Quando sentimos prazer

também o sentimos por partes

com distintas formas de gozar

cada uma com suas artes

 

Sentimos o tacto

o sexo

o sabor

o olfacto

o ouvido

o olhar

 

A alma não tem pernas

nem braços

nem olhos

nem ouvidos

nem mesmo coração

 

Mas caminha

ouve

sofre

e ama

inteira

 

E quando amamos

ou sentimos dó

a alma sofre e ama toda

verdadeira

 

Porque a alma é Única

Una

 

Uma só

 

             Vale de Salgueiro, 15 de Abril de 2008

             Henrique António Pedro


terça-feira, 28 de setembro de 2021

Pecar de amor

 


Pecar de amor 

é procurar no pecado

a virtude

 

É tomar a via do amor

para a Verdade

 

É gozar o prazer que induz

Espiritualidade

 

Jamais o Amor

que acende a luz da Iluminação

gera dor

e a Virtude

produz

ilicitude

 

Múltiplos são os caminhos da vida

e os meandros do destino também

mas um só sentido tem

a virtuosa paixão

 

O sentido único da Revelação

 

Vale de Salgueiro, quinta-feira, 25 de Março de 2010

Henrique António Pedro

(Imagem do Google)