Seja bem vindo/a. A mesa da poesia está posta. Sirva-se. Deixe, por favor, uma breve mensagem. Poderá fazê-lo para o email: hacpedro@hotmail.com. Bem haja. Please leave a brief message. You can do so by email: hacpedro@hotmail.com. Well done.

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Alzheimer

 




Alzheimer

Amanhã…

vou fazer tudo ao contrário

andar de trás para a frente

virar os retratos de pernas para o ar

 

Vou tocar os sinos no campanário

pôr a boca no trombone

desligar o telefone

 

Vou sorrir a quem nunca me sorriu

deitar a língua de fora ao Papa

mostrar o rabo à Rainha

chamar demente ao Presidente

alegrar os funerais com bandas marciais

e mandar a crise para a puta que a pariu

 

Vou chamar os poetas de patetas

deixar de escrever poesia

por de lado a gramática

e viciar os cálculos de matemática

 

Amanhã…

vou voltar à infância

comportar-me como criança

correr

saltar

viver a vida com alegria

usar peruca

deixar crescer barba e bigode

 

Amanhã…

vou fazer tudo ao contrário

 

Dizem que é a melhor forma de me precaver

pelo menos até morrer

… do Alzheimer

 

Vale de Salgueiro, sábado, 15 de Maio de 2010

Henrique António Pedro


 

sexta-feira, 26 de agosto de 2022

A Expulsão do Paraíso

 


A Expulsão do Paraíso

 

Contesto o Teu critério, ó Criador

De expulsar Adão e Eva do Paraíso!

Se foi Eva a causadora do prejuízo

Porque não expulsá-la só a ela, Senhor?!

 

Continuaria, assim, o homem, sem dor

A viver no Éden, em seu perfeito juízo

E a mulher na Terra, se eu bem ajuízo,

Mais feliz do que é, sem o homem por tutor.

 

Ou será que Adão quis Eva acompanhar

Tão ardente era a loucura da paixão

Que nem Vós, Senhor, os conseguiste separar?!

 

Se assim foi, então, tendes toda a razão!

Só àqueles que aprenderem a bem amar

Vós abençoais e concedeis a Salvação.

 

Vale de Salgueiro, 17 de Maio de 2008

Henrique António Pedro


quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Eu?! Sou um proto deus, um Prometeu

 


Eu?! Sou um proto deus, um Prometeu


Sei aquilo que sinto

Sinto aquilo que sou

 

Sou aquilo que sinto

Sou aquilo sou

 

Sou um proto deus cartesiano

Um Prometeu agrilhoado

Se minto

A mim mesmo me minto

A mim mesmo me engano

Deslumbrado

 

Acredito em Deus

Porque tenho consciência de mim

E em mim acredito

 

Sinto e penso com o coração, com as veias e as artérias, as células, o cérebro e razão, os instintos e os afectos.

 

Sinto dor em cada poro e sofro com cada pêlo que me cai.

 

 Sou algo que se abre como uma flor no meio de uma floresta de dor, de angústia, suposta felicidade e amor.

 

 Uma larva que se metamorfoseia em alegria e sofrimento, vida e fantasia.

 

Olho o Sol a contra luz

Do lado de cá da vidraça do Firmamento

Mas cego

Sem ver a Deus

 

Apenas vislumbro a sombra de mim

A sombra do meu espírito

Batido pela luz de Deus

O amor de Jesus Cristo

 

Por isso me ensimesmo

Me sinto um proto deus

Em sofrimento

 

Um Prometeu contristo

Agrilhoado à minha angústia

Devoro-me a mim mesmo

 

Vale de Salgueiro, 21 de Maio de 2008

Henrique António Pedro


domingo, 14 de agosto de 2022

“Dies irae, dies illa”

 


“Dies irae, dies illa”

 

Lúgubres são os anos

Trágicos os enganos

Adventos de piores tempos

 

Nunca houve tanta miséria

Tamanha opressão sobre a Terra

Tão desumana foi a guerra

Tão cruel a carnificina

Tão generalizada a fome

Tão exposta a doença

Tão desmedida a ambição

Tão descarada a ofensa

Tão global a maldição

 

Nunca tantos aviões voaram nos ares

Tantos rios foram aprisionados

Tamanha a poluição dos mares

Tantas as árvores derrubadas

Tantos animais violentados

Tão fundo a terra foi esventrada

Tão generalizadamente o solo conspurcado

 

Quantos mais aviões vamos pôr a voar?

Quanto mais auto estradas vamos abrir?

Quantas mais bombas vamos fabricar?

Quanto mais petróleo queimar?

Quantos mais infelizes vamos deixar morrer?

Quantos mais animais vamos chacinar?

 

O coração da legião dos famintos

E dos moribundos excluídos do mundo

Já entoa em tétrico silêncio

Acordes de “dies irae”

 

De ira são os dias que se avizinham…

Oh homens e mulheres de boa vontade!

Promovei desde já a mudança!

 

Dies ira … dias de Ira

Dies ila …dias de Esperança

 

Vale de Salgueiro, 6 de Dezembro de 2007

Henrique António Pedro


sábado, 30 de julho de 2022

Obrigado, amor

 


Obrigado

Amor

Por viveres

A meu lado

 

Por existires no meu espaço

Te deixares ver

E sentir

E permitir

Que me recline no teu regaço

 

Por não te importares que o vento

Espalhe o teu perfume

Em campo aberto

Para tudo perfumar

 

Ainda que dentro de mim

Ateie o lume

Da saudade e do sofrimento

Só de pensar

Que um dia

Te poderei não ter

Assim tão perto

 

Mirandela, 22 de Dezembro de 2004

Henrique António Pedro

In Mulheres de amor inventadas (1.ª Edição, Outubro de 2013)


segunda-feira, 4 de julho de 2022

Irena Sendler

 


(Varsóvia, 15 de fevereiro de 1910 - Varsóvia, 12 de maio de 2008),

 

Chorei!

Lágrimas líquidas verdadeiras

Rolaram-me pela face, silenciosas

Sinceras, sentidas, condoídas

Agora que sem a conhecer

A conheci

 

Em silêncio, mas chorei!

 

Lágrimas salgadas, reais

Envergonhado da minha pequenez

Da placidez do meu egoísmo

Ante o sereno heroísmo

De Irena Sendler que eu não conhecia

Tão grande ela é que se escondia

Tão cego é o mundo que ninguém a via

 

Chorei!

 

Lágrimas ácidas

Porque sofri no mais fundo de mim

Por todas as crianças vítimas do holocausto

Submetidas ao martírio nazi

Á má sorte

Ao mais atroz sofrimento

Á fome, ao frio, à doença

Á hedionda separação de suas mães

E que Irene heroicamente socorreu

E salvou da morte

 

Chorei!

 

Lágrimas de sangue de espaço a espaço

Por Irena torturada às mãos da Gestapo

 

Chorei

 

Lágrimas de luz

De suave alegria interior

Por ver que Deus nosso Senhor Jesus

Quando maior é a ignomínia dos homens

E mais malvado o seu desígnio

Sempre inspira algumas almas maiores

A minimizar a desgraça

E a mostrar-nos o caminho

 

 

Coloco este poema

Feito flor

Na montanha de flores

Que todos os dias

E nunca será tarde demais

Perfumam o quarto da anciã Irena

No asilo de Varsóvia aonde se esconde

Na sua inesgotável bondade

 

Obrigado Irena pelo seu heróico exemplo

Obrigado por si

Louvada seja por todo o tempo


Nota: Irena Sendler morreu dias depois d eu ter escrito este poema.

 

Vale de Salgueiro, 30 de Abril de 2008

Henrique António Pedro


quinta-feira, 30 de junho de 2022

Com este poema me despeço

 


Com este poema me despeço

Sem que a mim

A nada

E a ninguém

Diga adeus

 

A minha partida

Só será definitiva

Apenas acontecerá numa alvorada distante

Iluminada

 

Quando sobre a Terra reinar nova Civilização

Sem Política

Nem Religião

 

Quando a Humanidade estiver viva

E livre

E a vida for

Um hino de louvor a Deus

 O Criador

 

Se a vida sobreviver na Terra

À fome

À sede

À mentira

E à guerra

 

Só então direi adeus

Ao mundo presente

E me tornarei ausente

 

Com este poema me despeço

Sem que a mim

A nada

E a ninguém

Diga adeus

 

Vale de Salgueiro, sábado, 27 de Junho de 2009

Henrique António Pedro


quinta-feira, 23 de junho de 2022

Pinus, a árvore da serenidade

 



Pinus é o meu dilecto pinheiro manso

que plantei ainda na adolescência

era ele um tronco frágil e pequenino

uma ágil, verde e viçosa excrescência

 

Abri uma cova no solo sáfaro

à força dos músculos e da enxada

enchi-a de terra fresca e macia

reguei-a com amor, suor e fantasia

e ali deixei a planta pequenina

bem protegida e aconchegada

entregue aos desígnios do Criador

 

Mas vi-o crescer ano após ano

cada dia mais forte e desmedido

tornar-se árvore imponente

admirada por toda a gente

paradigma do espírito humano

sereno, vigoroso e desinibido

 

Resiste, agora, às maiores tempestades

indiferente, em seu tronco robusto

apenas de copa em sereno agitar

para, mais sensato, as deixar passar

 

Mas quando a brisa é doce e suave

entoa então melodias de encantar

que acalmam o espírito intranquilo

e amaciam o coração expectante

com mensagens do Cosmos distante

que apenas eu ouso decifrar

 

Mil vezes penso no meu íntimo

certo de ser ouvido por Pinus

o meu dilecto pinheiro manso

que valeu a penas ter nascido e viver

só para o plantar a ele e o ver crescer

 

Deu-me Deus este privilégio

este insondável sortilégio

de aprender com aquele lenho vivo

a crescer robusto e sereno

e a resistir firme à adversidade

a fazer da vida um hino de Alegria

plena de Poesia e de Verdade

 

Henrique António Pedro

in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016)


segunda-feira, 20 de junho de 2022

Impossível é viver sem sonhar


Caminho

calado

para lado nenhum

 

Percorro com a vista tudo que me rodeia

sem nada ver

ouço ruídos de fundo

sem perceber qualquer som

 

Embora mantenha os olhos

e os ouvidos abertos

todos os sentidos despertos

 

Calo também o coração!

Deixo-me de sonhos

e de afectos

 

Passo horas esquecidas assim

a vaguear por tudo quanto é sítio

fora de mim

sem passar por sítio algum

 

Há um instante em que paro, porém

ouço passos atrás de mim

 

Há uma pedra em que tropeço

um raio de luz que me induz

uma voz que me desperta

 

Sou eu que a mim mesmo me persigo

e que a mim mesmo me diz:

- Não! Tu não me podes fugir, assim!

Impossível será viveres sem sonhar

sem amar

sem acreditar

 

Sem ter fé

 

Henrique António Pedro

in Introdução à Eternidade (1.ª Edição, Outubro de 2013)


domingo, 12 de junho de 2022

A dor de amor é mais dor e mais dói


A dor de amor é mais dor e mais dói

se é só nossa

e é uma luta interior

 

A dor de amor é maior e mais dói

se não temos ninguém

um amigo, um pai, uma mãe

com quem desabafar

e que confortar

nos possa

 

A dor de amor é mais dor e mais dói

se gritamos ao vento o nosso lamento

e nem o vento nos sabe escutar

 

A dor de amor é mais dor e mais dói

quando só nós

de nós

sentimos pena

 

Mas a dor de amor é menor e menos dói

se a dor de amor

só dói

em poema

  

VS, 10 de Agosto de 2009

Henrique António Pedro


sexta-feira, 10 de junho de 2022

Que mil bombas de amor deflagrem sobre a Terra


Calar a verdade é mentir

Dar para receber é comprar e vender

Mentir é subtrair

A paixão sem amor é uma forma de odiar

Proclamar a paz a pensar na guerra

é uma forma de guerrear


Que os vírus malditos sejam de pronto circunscritos 

Que o ódio e o terror não vençam o amor

Que os donos do mundo reflictam

para que Hiroxima e Nagasaki se não repitam


Urge libertar a Humanidade do vício e da animalidade 

Que mil bombas de amor deflagrem sobre a Terra

para que a Paz triunfe sobre a guerra


Vale de Salgueiro, 1 de Setembro de 2007

Henrique António Pedro


quinta-feira, 9 de junho de 2022

O tempo: epifenómeno do movimento.

 


 

Existe em função do movimento

O tempo

 

Do espaço

E do embaraço da Razão

Tomada de ilusão

 

Sucessão de acontecimentos

E de eventos

Que ocorrem sem cessar

De que só o Espírito

Mais puro que o pensamento

É capaz de se libertar

 

O tempo

Epifenómeno-do movimento

 

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 22 de Abril de 2009

Henrique António Pedro