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sábado, 1 de abril de 2023

Eu?! Sou um proto deus, um Prometeu!

 


Eu?! Sou um proto deus, um Prometeu!


Sei aquilo que sinto

Sinto aquilo que sou

Sou aquilo que sinto

Sou aquilo sou


Sou um proto deus cartesiano

Um Prometeu agrilhoado


Se minto a mim mesmo minto

A mim mesmo me engano

Deslumbrado

 

Sinto, penso, com o coração, as veias, as artérias, as células, o cérebro e a razão, os instintos e os afectos.

 

Sinto dor em cada poro e sofro com cada.

 

 Sou algo que se abre como uma flor no meio de uma floresta de dor, de angústia, suposta felicidade e amor.

 

 Uma larva que se metamorfoseia em alegria e sofrimento, vida e fantasia.

 

Olho o Sol a contra luz

Do lado de cá da vidraça do Firmamento

Mas cego

Sem ver a Deus

 

Apenas vislumbro a sombra de mim

A sombra do meu espírito

Batido pela luz de Deus

O amor de Jesus Cristo

 

Por isso me ensimesmo

Me sinto um proto deus

Em sofrimento

 

Um Prometeu contristo

Agrilhoado à minha angústia

Devoro-me a mim mesmo

 

Vale de Salgueiro, 21 de Maio de 2008

Henrique António Pedro


segunda-feira, 27 de março de 2023

À hora do despertar dos mágicos

 


À hora do despertar dos mágicos

 

A luz da Lua

coada pela neblina

não chega a ser luar

sequer

 

É tremulina a tremeluzir

nas águas do lago

que a brisa faz ondular

 

Cantamos e dançamos

nus

dementes

de mão dada

quase até de madrugada

 

Eu e minha amada

 

Qual faunos fosforescentes

por entre árvores despidas

plantadas hirtas no nevoeiro

 

Até que os mágicos despertem

à hora em que os humanos devem ir dormir

e deixar livre o terreiro da imaginação

seu privilégio

nosso sortilégio

nossa humana condição

 

É a hora de regressar a casa

cabisbaixos

resignados

calados

doridos

arrependidos

de alma em brasa

expulsos do fantástico paraíso

pelo trágico juízo mágico

 

Outro é o nosso lugar

 

Vale de Salgueiro, sábado, 23 de Janeiro de 2010

Henrique António Pedro

sexta-feira, 24 de março de 2023

A minha alma mora no meu coração

 


Não mora na minha mente

a minha alma

como demente

cheguei a pensar

 

Nem mora em nenhum órgão

glândula ou apófise

como pus a hipótese

 

A minha alma mora no meu coração

 

É lá que passa a maior parte do tempo

divertida

a deixar-se emocionar

 

De onde sai levada pelo vento

sempre que o pensamento

se põe a divagar

 

E quando encontra coisas que a fazem sofrer

ou a Razão não é capaz de compreender

uma dor

uma cruz

é ainda no meu coração

que a minha alma

se vai refugiar

 

A minha alma mora no meu coração

é de lá que sai essa luz

a que se chama Amor

 

Vale de Salgueiro, domingo, 20 de Maio de 2012

Henrique António Pedro

segunda-feira, 13 de março de 2023

Poema de bem barbear toda a face

 



POEMA DE BEM BARBEAR TODA A FACE

 

Muitos dos meus poemas

afloram frente ao espelho

quando me barbeio

 

Enquanto a vista se fixa em cada pêlo

que a lâmina vai cortar

eu no meu eu me enleio

em pensamento

nos morfemas e lexemas

em poético devaneio

 

E lamento todo aquele que se pela e depila

sem apelo nem agravo

capaz de matar e morrer

sem de poesia nada querer saber

mesmo que perca a face

por mais que disfarce

 

Há na vida milhares de poemas

e dilemas

para cortar

e recortar

ou simplesmente deixar crescer

mesmo no acto de barbear

 

Vale de Salgueiro, domingo, 30 de Outubro de 2011

Henrique António Pedro


terça-feira, 7 de março de 2023

Mulher é poema feminino

 


Mulher é poema feminino

 

Mulher é poema

feminino

 

Que só a mulher escreve

descreve

anima

declama

por palavras escritas

e faladas

 

Palavras que são verbos:

amar

beijar

sorrir

sonhar

 

E adjectivos:

linda

encantadora

sedutora

sensual

monumental

 

E substantivos:

amor

anjo

flor

alegria

sonho

fantasia

poesia

 

E orações quais:

as curvas do seu corpo

as circunvoluções do seu andar

as harmonias do seu falar

as ondulações dos seus cabelos

o brilho do seu sorriso

os apelos do seu olhar

 

Palavras que se concertam em versos

e rimam perfumados de poesia

e convidam a ler

mesmo sem nada se entender

e fazerem perder o tino

 

Mulher é poema

divino

 

Vale de Salgueiro, sábado, sexta-feira, 20 de Novembro de 2009

Henrique António Pedro

 

domingo, 26 de fevereiro de 2023

À luz da minha cosmologia que é a poesia

 


À luz da minha cosmologia que é a poesia


Como a ciência moderna induz

O universo começou

Com uma explosão de luz

Que gerou as forças centrífugas

Que em cósmica vertigem

Se expandem e nos afastam da Origem

Em sofrimento e dor

 

Foi o primeiro verso

Do poema inacabado da Criação

Que se consumará na Redenção

 

Então

Também o pecado se mede em anos-luz

Tal a distância que nos separa de Deus

 

E o Amor

À luz da minha cosmologia que é a poesia

É a força centripta de retorno a Deus

Que na Verdade de Cristo Jesus

Tem a dimensão da Eternidade

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 4 de Agosto de 2010

Henrique António Pedro


quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Ego sum qui sum!

 


Ego sum qui sum!

 

São os meus pensamentos

afectos e sentimentos

minha força de amar

que põem o Universo a pulsar!

 

Ser ou não ser

não é a questão

mas antes saber

se sou ou não ilusão

 

in Minha Pátria Montanha

(Editora Ver o Verso-2005)


segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

O AMOR EM TODOS OS SENTIDOS

 


O AMOR EM TODOS OS SENTIDOS

 

O Amor…

 

não tem olhos, mas vê

e dá novo brilho ao olhar

 

não tem ouvidos, mas ouve

a harmonia da sinfonia do viver

 

não tem boca, mas canta e encanta

e à vida dá prazer

 

não tem olfacto, é inodoro de facto

mas a tudo dá perfume

 

não queima como o lume

mas aquece e enternece

 

não tem tacto, mas tacteia

e delicia com carícia

 

é insípido, não tem sabor

mas dá gosto ao paladar

 

não tem sexo, mas sublima a sensualidade

 

não tem coração, mas palpita

e dá verdade à paixão

 

não tem cérebro, mas pensa

e aviva a criatividade

 

O Amor…

não tem sentidos, mas sente

e seja em que sentido for

só o Amor dá sentido aos sentidos

e ao viver razão de ser

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 18 de Fevereiro de 2009

Henrique António Pedro


sábado, 18 de fevereiro de 2023

O mais glorioso acontecimento da minha vida

 



                            O mais glorioso acontecimento da minha vida


Sem merecimento é, de facto

o acto do meu nascimento

embora seja da minha vida

o mais glorioso acontecimento

ainda que não saiba bem

donde vim

 

Vim algures dalgum além

vogando no ventre de minha mãe

 

Tão pouco sei o que vim aqui fazer

e apesar de não me lembrar

muitos se alegraram com tal acto

sobretudo minha mãe,

apesar de ser ela a sofrer

as dolorosas dores de parto

 

Apenas eu chorei quando nasci

inquieto

porque a vida já me doía

por não perceber por certo

o que estava a acontecer

 

De mim nunca me aparto, ainda assim

toda a minha vida morei comigo

hora a hora

na mesma rua

no mesmo lugar

sob o Sol e sob a Lua

a saltar de terra em terra

em tempos de paz ou de guerra

 

Continuo a não me conhecer

a não saber quem sou

quem é o eu que dentro de mim mora

 

Sinto-me um ser mutante

um cavaleiro andante

o filho de minha mãe e de meu pai

que não sabe para onde vai

por não saber donde vem

 

Vale de Salgueiro, 29 de Dezembro de 2016

Henrique António Pedro


 

 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

Prender e ficar preso por prazer

 


Prender e ficar preso por prazer

 

Lamento tão volúvel como o vento

uma nuvem fugidia

que apenas ilude

e adia

o sofrimento

 

Assim é o prazer de prender e ficar preso

a que chamamos paixão

que não passa duma ilusão

de que não nos libertamos

só porque pensamos

que amamos

 

À força de desejar mais do que amar

na trama de suas teias

ao peso de suas cadeias

mais acabamos por nos amarrar

 

Este prazer de prender e ficar preso

a que se chama paixão

não é liberdade de verdade

não

 

É sim

prisão

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 2 de Março de 2009

Henrique António Pedro

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

ANJO ANGUSTIADO

 


ANJO ANGUSTIADO


Deito-me sobre a relva

Em posição decúbito dorsal

Na ilusão fundamental

Inconsistente pensamento

De que ocupo sempre o centro do Firmamento

Vá para onde for

Deite-me com quem me deitar

 

Percebo a Via Láctea à minha esquerda

No céu límpido

Semeado de estrelas

 

Da direita chega-me o perfume das tílias

Floridas neste início quente de Verão

 

Fixo a vista na Estrela Polar

Aí me prendo a sonhar

 

Em breve a minha angústia

Alaga todo o Universo visível

E mais os invisíveis

 

Acabo por adormecer

Como um anjo angustiado

 

Vale de Salgueiro, sábado, 28 de Junho de 2008

Henrique António Pedro 

in Angústia, Razão e Nada (Editora Temas Originais-2009)

sábado, 4 de fevereiro de 2023

Sons e silêncios que nos que nos tocam por dentro

 


Sons e silêncios que nos que nos tocam por dentro

 

Há sons e silêncios que nos tocam por dentro

sinais de que vivemos além do mais

 

São ecos

reflexos

de sons ouvidos em todos os sentidos

 

Sonoridades de verdade

sons de saudade

saltérios gregorianos

sons de espiritualidade

 

São sons que nos tocam por dentro

 

Tonalidades de verdades

timbres de afastamento

 

São lamentos de alguma mãe a sofrer

ruido de algum amor a esquecer

 

São sons doridos de sinais

silêncios de sepulcro

fulcro da religiosidade

 

São silêncios de pássaros agoirentos

pios sinistros de pardais

 

São chamamentos do além

de quem

aquém

não podemos esquecer

 

É o som do refulgir das estrelas

o silencio doce do luar

o tremeluzir da eternidade

 

Vale de Salgueiro, 4 de Fevereiro de 2023

Henrique António Pedro

segunda-feira, 30 de janeiro de 2023

ESTA SAUDADE CADELA

 


ESTA SAUDADE CADELA


Esta saudade cadela

morde-me e ladra-me a toda a hora

furiosa

e não me deixa dormir

 

Em vão tento amansá-la

imaginando a minha amada

saudosa

a sorrir-me

amorosa

a escrever este aerograma

que agora tenho na mão

e em que me diz que me ama

 

Aerograma que leio e releio

e mas mais me enleio

nesta cruel nostalgia

saudade cadela

insidiosa

que à lua ladra à toa

 

Só mesmo a poesia

dá conta dela!

 

Nangololo, Cabo Delgado (Norte de Moçambique), Agosto de 1972

Henrique António Pedro

In Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016)