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domingo, 12 de novembro de 2017

Colhendo poemas directamente das árvores





O benefício maior de se viver no campo
é podermos ir ao pomar
colher poemas directamente das árvores
sempre que nos apetecer

Quando não são as aves que no-los trazem
adejando à nossa volta
e chilreando melodias

Ou o Sol
ou a lua
ou as estrelas
que com os seus raios de luz escrevem eles próprios
os versos
na nossa alma

enquanto nós nos limitamos
a ler
deslumbrados

E quando pela manhã abrimos a janela
e descobrimos que não temos nenhum sítio para aonde ir
nada mais que fazer
atiramos um punhado de milho aos pardais
e pomo-nos a escrever




sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Palavras tresmalhadas pelo vento





Regurgito golfadas de poemas
desejosos do supremo sacrifício da poesia
apunhalado que foi o meu coração

Tomo um punhado e atiro-os ao ar
deixando que seja o vento
a tresmalhá-los em palavras

Raras
sobem como estrelas
no céu
cintilando
noite adentro

Poucas
são levadas pelos aves
delicadamente nos bicos
para construir os ninhos
e alimentar as crias

Outras
são arrastadas pelos rios
para o mar
terminam nas redes dos pescadores
ou diluídas no seio da tempestade

A maior parte
porém
são estraçalhadas
pelas mandíbulas ferozes dos políticos

Até que nas minhas mãos vazias
apenas resta aflição




terça-feira, 31 de outubro de 2017

Quando a alma nos cai aos pés





Alguém como eu condenado às galés
e que seguia à minha frente
por um caminho empedrado
inadvertidamente
deixou cair a alma
aos pés

Tilintou
saltitou
e acabou por se ocultar
sem se partir
como se fora um berlinde de cristal
incandescente

Em redor não se via vivalma
e não adveio daí
outro mal
ao mundo

Alguém que seguia a meu lado
por um caminho relvado
deliberadamente
deixou cair o coração
soltando-o da mão

Ouviu-se um baque surdo
e ali ficou plasmado
como se fora um pastel ensanguentado
vivo
a latejar

Alguém que vinha atrás de mim
por um caminho enlameado
irreflectidamente deixou cair o cérebro
no chão
por erro de lógica
sem razão

Fez plof!
Ainda esbracejou
como se ensaiasse nadar
mas acabou por se afundar
e ali ficar atolado
com a consciência à tona
por algum tempo
como se fosse uma azeitona
enquanto a memória
diluída no vento
apodrecia na História

O primeiro Alguém iluminou-se
sem combustão

O segundo apaixonou-se
ardeu
sem compaixão

O terceiro enlouqueceu
ninguém lhe valeu
restaram os ossos

Eu segui em frente
por entre, cacos e destroços
à procura do meu berlinde irisado
que andará por aí
perdido em qualquer lado
a cair sem se partir

Quando a alma nos cai aos pés
partimo-nos todos
espalhamo-nos
cada bocado para seu lado

Só nos levantamos por inteiro
se recuperamos a alma
primeiro
mesmo se perdemos a razão
e o coração



sexta-feira, 20 de outubro de 2017

Lenda de Santa Comba e São Leonardo


Neste mesmo local em que ora me assento
donde diviso todo o vale
perpassado pelo vento da recordação

Vivo com emoção o trágico momento
tempo da História já fora da memória
com o coração a bater
a querer saltar do peito
sem jeito de se conter

Sinto a terra a arfar
a pulsar com a dor do pastor Leonardo
morto ainda criança
trespassado pela lança do mouro javardo
que acaba de o esventrar

E ouço os soluços de sua irmã Comba
de bruços a chorar
naquela funesta manhã

O cavalo alfaraz a relinchar
com os cascos a bater
qual tenaz
na fraga que se abriu
para esconder a Comba cristã

Fraga que ainda guarda
a ferradura gravada
a quente
jura muito crente que bem viu

Imagino agora eu a casta adolescente
a voar
Comba feita pomba
a subir ao Céu

Para virar santa
venerada
moira encantada
que encanta o povo que a canta
por toda a Terra Quente

Henrique António Pedro

in Anamnesis (Janeiro de 2016)



quinta-feira, 19 de outubro de 2017

Estarei no messenger, mais logo, para lhe falar



Aqui
O vento que se levantou ao fim do dia
Já veio tarde
Mas deu para limpar o céu
Das negras nuvens do fumo dos incêndios florestais

Ademais
O Firmamento está agora límpido
Cerúleo
Cristalino

Dá para ver na perfeição a Via Láctea
Que se distende na direcção Norte-Sul
E se me enrodilha na Razão
Salpicada de estrelas bruxuleantes
Rangendo de silêncio

Imagino que aí
Do lugar em que te encontras
Duma janela de um vigésimo terceiro andar
Dá para veres
Por certo e na perfeição
O arco da Baía de Guanabara
Em todo o seu esplendor
De som e néon

E ouvir
O bater do seu coração

Fantástica é a poesia
Que nos dá olhos para ver
E ouvir
Com amor e alegria
Coisas tão distintas
E ainda mais
O indistinto que certas coisas têm

E que diferença faz a pesada espiritualidade
Da minha vista
Da suave sensualidade
Do seu olhar?

Nenhuma

Na minha
Uma mulher nua
Láctea
Toca violino
Ao luar

Na sua
Um homem se despe
Doirado
No mar

Estarei no messenger
Mais logo
Para lhe falar


terça-feira, 10 de outubro de 2017

Eyjafjallajokull



Lá na distante e fria Islândia
uma mulher frívola e fulva
linda como a Lua
cavalgava nua
montada no cavalo de desejo
à procura de alguém
que lhe desse um beijo

E tão forte era o seu desejo e o seu trotear
que o vulcão Eyjafjallajokull acordou
e de imediato se pôs a ejacular
lava e cinza vulcânica
que obscureceu os céus da Europa oceânica
com véus de ansiedade

Foi quanto bastou
para que os europeus não pudessem respirar
e os aviões deixassem de poder voar
até que vulcão Eyjafjallajokull amainou

A Mãe Natureza manda na Terra de verdade
pare o homem de a provocar


sexta-feira, 29 de setembro de 2017

No auge do Verão







Inesperadamente
Milhares de borboletas brancas
Predominantemente
Também raiadas
Coloridas
Delicadas
Saídas de todos cantos
Dos nadas
Tomaram conta do jardim

Saciadas da sede de amor
E de água
Apenas lhes apetece voar
E são tantas
A esvoaçar à minha roda
Que já nem há mais espaço para onde ir
E eu não tenho outro remédio
Tão despudorado é o assédio
Senão deixar os meus poemas
Voar com elas
Saltitando por entre as rosas
E o jasmim


É tempo de festejar o auge do Verão
Antes que o vento frio de Outono
As faça cair de novo no sono
Hibernal
Regressando aos cantos dos nadas
De onde vieram
Para por lá ficarem pasmadas
Larvares
Monstruosas

Os meus poemas permanecerão acordados
Durante todo o ano
Engravidados de poesia
Sempre a adejar
Em torno de mim

Já sinto a nostalgia


terça-feira, 29 de agosto de 2017

Ainda há lágrimas por chorar, Hiroshima



(Horoshima foi a primeira cidade da História arrasada por uma bomba atómica, lançada em 6 de Agosto de 1945, que terá causado mais 250 mil mortos e feridos.)


Não é ainda a Paz que aos homens anima

já é tempo de parar

ainda há lágrimas por chorar

Hiroshima

 

Ainda há holocaustos por exorcizar

 

Já é tempo de pôr fim à fome e à guerra

à mentira e a miséria

à política falaz

que assola toda a Terra

 

Já é tempo de fazer valer a Verdade

tempo de quem já nada espera

voltar a ter tempo de acreditar

tempo de gritar

Liberdade

 

Tempo de os homens serem homens

de os homens serem

Humanidade

 

Já é tempo

antes que seja demasiado

tarde

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 6 de Agosto de 2008

Henrique António Pedro

 

 




domingo, 6 de agosto de 2017

Seara ondulante




Seara ondulante

liana enleante

o vento do amor a faz ondular

 

Lago de perfume que inalo

oceano de virtude

mar de engano

funesto arcano

nele se afundam meus dedos

em mil ternuras

sem medos

de se afogar

 

Cabelo de mulher…

 

Mil cordas de cítara a gemer

que me delicia dedilhar

melodias de entontecer

céu de espiritualidade

 

Crina de égua a relinchar

ululante de prazer

 

Cabelo de mulher…

 

Que sublime prazer

me dá

afagar

 

Vale de Salgueiro, sexta-feira, 19 de Fevereiro de 2010

Henrique António Pedro

sábado, 5 de agosto de 2017

Cento e cinquenta e seis badaladas






Cento e cinquenta e seis badaladas concertadas
o dia tem
mais a melodia que o nosso coração
bate no ventre de nossa mãe
que ela ouve
mas nós não ouvimos não

Doze badaladas que o coração bate ao meio dia
como cão a latir

Ruidosas
apressadas
pressurosas
a fugir
a saltar fora do peito
a viver sem jeito
fora de si

Doze badaladas que o coração bate à meia-noite
como vento a rugir
já fora de tempo

Langorosas
arrastadas
pesarosas
até parar
e cair
no esquecimento

Mais as badaladas silenciadas
quando dormimos
ou não sentimos
o coração bater por ninguém

Cento e cinquenta e seis badaladas compassadas
o coração bate hora a hora
dia a dia
mundo fora
aqui
ali
além
embora não saibamos quantos dias
a vida
sofrida
tem



sexta-feira, 28 de julho de 2017

Pólen de poesia






Aguardo ansioso
o eclodir da próxima Primavera

À espera que as plantas desabrochem
para também eu espalhar poemas no ar
deixando que os meus versos
se diluam nas gotas do orvalho matinal
e se transformem em grãos de pólen
que levados pela brisa primaveril
nos bicos das aves
e nas patas das abelhas
penetrem nos gineceus das flores
e as engravidem

E assim a Primavera
quando florir o mês de Abril
terá a cor
a luz
o som
o sabor do amor juvenil
e a alegria
da minha própria poesia



terça-feira, 25 de julho de 2017

Lamúrias de amor da sibila Dores Roha



Apenas tu ser amado
não duvido
tens a ver com a felicidade
que vivo a teu lado

Se me assalta a angústia da separação
qual vento desalmado
te digo do fundo do coração
o sofrimento que adviria
nada teria a ver contigo

Porque ninguém ama por obrigação
ou continua a amar
por gratidão

Depende de mim continuar a apertar as tuas mãos
e de ti continuar a beijar
com teus lábios os meus
mas é no amar e desamar
que mais dependemos de Deus

Não deixaria de te amar
nem que te afastasses de mim
ainda que o amor fosse então
uma saudade sem fim

 in Códice da Pátria Luanca (Ver o Verso Edições, 2006)



terça-feira, 11 de julho de 2017

Fim do infinito, termo da eternidade




O Absoluto é atributo de Deus
e instituto dos anjos

No qual crentes e ateus
infinito e eternidade
dúvida e verdade
se irão consumar

Por isso não tem sentido a eternidade
por não haver relógio para contar o tempo
sem cessar

Nem tem sentido o infinito
por não haver régua para medir o comprimento
sem se esgotar

Por isso pode o início do tempo
e o princípio do espaço
o homem sincronizar
jamais seu fim e seu termo determinar

Por isso o fim da dúvida é o princípio da verdade
e o fim da dor o começo da felicidade

E tudo se reduz ao amor
fim do infinito
e termo da eternidade



sexta-feira, 7 de julho de 2017

Lugares recônditos da minha alma  




Há lugares
recônditos
da minha alma
aonde
eu próprio
raras vezes vou

Apenas quando sou assediado
por algum evento inusitado

São aposentos reservados
onde não sopra o vento
nem se faz sentir a fúria do mar
ou as tempestades do viver comum

Ali me refugio
me protejo
e me liberto
em ambiente de espiritualidade

Tranco portas e janelas
tapo os ouvidos aos ruídos da rua
apenas deixo acesa uma luz
suave como a da Lua
e por ali fico na obscuridade
de alma distendida
até me acalmar

São lugares recônditos da minha alma
túneis
labirintos de espiritualidade



sexta-feira, 23 de junho de 2017

Portugal morreu? A minha Pátria, essa, não!


 

 

Portugal morreu?

ainda não!

Jaz moribundo às mãos da corrupção

e das teias de traição que o inimigo teceu

 

Portugal morreu?

A minha Pátria, essa não?

 

A minha Pátria é o meu Povo

é a Língua que fala

a História que conta

é Verdade, é Democracia

é poesia do tamanho do mundo

do Quinto Império nostalgia

futuro que o povo reclama

 

A minha Pátria é Camões, é Gama, Vieira e Pessoa

Albuquerque, Silveira, Santo António de Lisboa

é Aleixo Corte-real, o notório Honório Barreto

é Portugal etéreo, amarelo, branco e preto

 

A minha Pátria é fogo, é chama, é fumo

é uma Nação enganada

à procura dum novo rumo

 

A minha Pátria é o meu Trás-os-Montes natal

suas lágrimas e suas fontes

meu Santo Graal

 

Portugal morreu?

A minha Pátria, essa, não!

 

A minha Pátria é Portugal!

  

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 4 de Junho de 2012

Henrique António Pedro




quarta-feira, 21 de junho de 2017

Ser livre é viver feliz







Eu próprio
em liberdade
me sinto numa prisão
infeliz

Numa gaiola maior
do tamanho da Terra
com grades de angústia

Por isso lhe daria a liberdade
se tivesse a garantia
de que livre
sobreviria

Porquê condená-la à morte
prematura
se a sei feliz a chilrear
enquanto viver
nesta postura?

Acabará por morrer

Pois então que morra
mas que morra livre
e verdadeira

Que aprenda que ser livre
é viver feliz
mesmo prisioneira