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quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Vou fugir para o futuro distante




Vou fugir para o futuro
distante

Pôr-me a andar daqui
para fora

Já!
Agora!

Fugir da miséria
da guerra
da mentira
da corrupção
da poluição
e da tragédia

Vou fugir para o futuro
distante
sem demora
e levar comigo todos a quem
quero bem

Aqui
e agora
no presente
já tudo que é bem
está ausente
nalgum lugar

Só já dá
mesmo
para sonhar

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sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Angélica




Foi o meu primeiro grande

mas não definitivo

amor

 

E continua a ser

seguramente

aquele que mais me marcou

 

No corpo

na vida

e na mente

 

Apaixonámo-nos sem o saber

na alvorada da puberdade

e amámo-nos com doce e pia paixão

por toda a feliz e distendida adolescência

 

Tudo se consumaria à entrada da idade adulta

(oh, que terrível perturbação, que dramático dilema!)

dele resta esta saudosa e terna imanência

que só agora ouso converter em poema

 

Angélica era linda!

Tinha o rosto iluminado de espiritualidade

luz que se reflectia nos seus cabelos de oiro

com a mesma religiosa luminosidade

da dócil chama da lamparina de azeite

que tinge de santidade as santas imagens

nos altares de uma qualquer catedral

 

Tinha o porte e a graciosidade de uma divina vestal

a voz profética e o olhar fascinante de Sibila

o semblante superior e doce de Afrodite e Artemisa

imagens que o meu espírito enamorado construía

no estudo da história de Atenas e Roma antigas

 

Angélica era uma deusa!

Que me fez deus, seu igual, quando me confessou

ser eu o arquétipo das imagens que também ela formava

nas mesmas leituras das mitologias grega e latina

sendo nosso Olimpo o idílico Jardim Municipal

em Aquae Flaviae

nas margens plácidas do bucólico rio Tâmega

a que se confinava o nosso juvenil conceito de alfa e ómega

 

Mutuamente apaixonados sem o saber

não sabíamos ainda que coisa era amar

por isso nos limitávamos a passear lado a lado

e a sorrir

a brincar

e a arfar de forma desconhecida

sempre que nos estreitávamos em inocente abraço

cientes de não sofrer de doença respiratória

nem haver razão de cansaço

 

E assim crescemos platonicamente enamorados

tão puros e inocentes que ainda hoje tenho na ideia

que Kant escreveu a Crítica da Razão Pura a pensar em nós

embora não fôramos nós a interrogar-nos:

Que poderíamos nós, de facto, saber?

Que deveríamos nós, em verdade, fazer?

O que nos era lícito esperar de nós?

 

Respondeu Kant a estas filosóficas questões?

Nunca nos interessou verdadeiramente saber

 já que mantivemos a mais estreme fidelidade

 à pureza daquele nosso amor da menoridade

 

Até que um dia…

… largámos Kant

(e passando à margem de Comte)

mergulhamos na leitura dos Evangelhos e de Santo Agostinho

passamos, ao de leve, pelas Suras do Corão que falam da mulher

(a que dissemos, obviamente, não, nunca, jamais!)

para acabarmos por cair nos mais apetecidos orientais

em Buda, Tao, Sri Aurobindo, no Tantra Ioga e no Kamasutra

 

Até que um dia…

…chegou a hora de deixar o Olimpo Municipal

de procurar outros saberes na universidade da vida

e nos espaço mais amplos do futuro e da Capital

 

Foi então quando…

nós que nos amávamos tanto

por encanto nos demos conta

de que estávamos livres e sós

como Adão e Eva tomados da sua própria ciência

expulsos do Paraíso

condenados à nossa própria consciência

e cientes agora de que nem um nem o outro éramos deuses

mas simples mortais

decidimos tentar sê-lo, então, por via do amor

e à força de tanto viver a dois

e de amar mais

 

E seria com beijos, abraços e loucuras sem fim

à força de tanto "sexar"

que ousamos alcançar a Iluminação

(oh, que sublime privilégio!)

 

acreditando piamente que com tanto amor

envoltos nas ondas inebriantes da comunhão de prazer

voaríamos para fora dos nossos corpos

nos tornaríamos etéreos e santos

e de espíritos abraços num deleite desmedido

cumpriríamos, por fim, o nosso divino sortilégio

 

Por inúmeras vezes estivemos à beira do nirvana, é certo

mas nunca se fez luz em nossos espíritos

apenas luar

 

Nunca verdadeiramente lá ousamos chegar

até que depois de muito e muito tentar

acabamos por concluir que o amor de homem e mulher

apenas serve para ter prazer e fazer filhos

e nunca

por si só

para nos salvar!

 

E as palavras mais frias, nuas e cruas que até hoje ouvi

e a que nunca, por insanidade mental, correspondi

vieram de Angélica, já no estertor da separação

mas que ainda hoje me causam indizível dor

 

Disse-me ela, pelo telefone, à distância

com a habitual superior doçura

numa derradeira instância de salvar

o que perdido estava de veras:

 - Nunca me rendi, nem rendo, às minhas lágrimas

mas não resistirei às tuas se forem sinceras

 

Não chorei

na altura

(oh, que terrível perturbação, que dramático dilema!)

mas faço-o hoje e agora, arrependido

aqui

neste poema


Vale de Salgueiro, 25 de Janeiro de 2008

Henrique António Pedro


in Mulheres de Amor Inventadas (Ed. Autor-Out 2013)



terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Tão felizes que nós éramos!




Sim
éramos felizes
porque nos amávamos

E tão felizes nós éramos
sem o saber!

Mas deixámos de o ser quando deixamos de nos amar
e procurámos a felicidade noutras paragens
deslumbrados por outras imagens
miragens de puro prazer, poder e riqueza

Quando ousámos ser mais belos
ainda
do que éramos
recorrendo a artifícios
e sacrifícios
que desnaturaram a beleza
que a Natureza nos ofertara

Quando iludimos a poesia
a convertemos em futilidade
e deixámos de cantar com verdade
o amor

Ainda resta
uma réstia de felicidade
porém
na saudade que agora
nos assola o coração
e ainda bem

Poderemos voltar a ser felizes
Sim

Basta que voltemos a nos amar

Tão só!

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domingo, 27 de janeiro de 2013

Uma curva do caminho




Foi lá que aprendi a andar
a tropeçar
a cair
e a me levantar

A subir
para ver o vale
de cima

A descer
para debaixo
contemplar o cume

A mudar de direcção
para poder
seguir adiante
incólume

Mesmo agora
que já me não dá prazer
subir ou descer
a correr
esfusiante
como quando menino
apraz-me parar a meio

Para pensar
repensar
e respirar
em ar aberto
para repor o coração
a bater certo
em seu anseio

Naquela curva do meu caminho
uma simples volta na ladeira
da colina onde moro

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sábado, 26 de janeiro de 2013

Vejo-me nos seus olhos




Assim ela melhor se mostra
e se denuncia
e melhor eu a vejo
e com mais força mais a desejo

Vejo-me nos seus olhos

Vejo nos seus olhos o que lhe vai na alma
e tudo que os seus lábios
e palavras
escondem

Ouço o silêncio
do seu sorriso

A partir daqui invento-a
e reinvento-me a mim

Levado nas asas da imaginação
e do vento
sopro
da paixão

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sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Uma mulher apaixonada




Escreve-me

Para me dizer
que é uma mulher apaixonada
mas não me diz
por quem anda enamorada

Depreendo
se bem a entendo
que seja por mim
embora eu nada tenho a ver com isso

Por isso
e pelo sim
e pelo não
respondo-lhe
em manobra de diversão
que também eu sou
um eterno enamorado
por carácter um apaixonado
Emotivo, Activo, secundário (EAs)

E que para melhor me compreender
Emst Kretschmer deve ler
já que a questão é de caracterologia
embora a trate eu com poesia

Se leu o que lhe recomendei
não sei

Certo é que de pronto se desapaixonou
e que por bem ou por mal
nunca mais me escreveu
ou me falou

Não era uma apaixonada
não
muito menos uma Passionária
do coração

Era só uma sentimental
Emotiva, Activa, primária (EAs)

Poeta dixit

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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Sons




A gota da clepsidra
seja de areia ou de água
acerta a vida
nada diz da mágoa

O som do diapasão
afina o tom
do violão

O sinal do sino
convida à oração

O longo ecoar do gongo
mais parece um lamento
a toar o tempo

A toque de caixa
ninguém se rebaixa

O rugido de leão
na savana
a ninguém engana

O barrido do elefante
que raspa o chão
tonitruante
dizem ser parecido
com o som da vuvuzela
e que não há outro como o dela

Deixa um zunido
enorme
no ouvido
causa dor
e faz toar a Razão

Mas não faz esquecer
a fome
seja de falta de amor
ou de pão

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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Trago um sentimento ágrafo agrafado no peito




Trago um sentimento ágrafo
agrafado no peito
atravessado
na garganta


Abafado
sem jeito

Incapaz de expressar
seja a escrever
ou a falar
a mim mesmo me espanta

Tomara ter
a coragem de uma aragem
para lhe dizer
e lhe confessar
que a amo

Mas temo ser traído
pelo vento

Mal ela sabe com ando sofrido
da raiva que derramo
dentro de mim
por ser assim

Mas eu a amo

Dói
só de o pensar

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domingo, 20 de janeiro de 2013

Uma chávena de angústia






Entrou de mansinho

surgida da rua

vestida de lua

e sentou-se na mesa ao lado da minha

vida 


Pediu uma chávena de porcelana

imaculada

vazia

de nada


Que encheu de angústia

adoçou com amargura

e mexeu

com a colher da poesia

por entre vapores de Baco

e baforadas de tabaco


Despediu-se sem alegria 

quando eu já bebia

de pé

a minha chávena de café

e de ansiedade


Remexeu

comigo

aquela mulher


Tanto que a impressão carmim

dos seus lábios

rubros de sensualidade

no bordo da chávena de porcelana

imaculada

permanece indelével

dentro de mim

 

in Mulheres de Amor Inventadas

(1.ª Edição, Outubro de 2013)

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

A samarra transmontana


 

É uma relíquia transmontana
Esta nossa veneranda samarra
Sendo típica veste de montanha
Na verdade, nada tem de bizarra

A pele doirada, de cor piçarra
De dócil raposa sacrificada
À vaidade que lhe deitou a garra
Tem a docilidade entranhada

É indumentária de estação
Que protege do frio no Inverno
Aquecendo corpo e coração.

Todos, no meu Trás-os-Montes paterno
A vestiam bem e com distinção. 
Era, afinal, um sinal fraterno!

Vale de Salgueiro, sábado, 21 de Agosto de 2010
Henrique Pedro

sábado, 12 de janeiro de 2013

É sempre de si que o poeta fala




Quando chora ou ri

Quando cala
ou canta a dor
ou exalta o amor

Quando se angustia
e abre a mente à fantasia

Quando vitupera a mentira e a guerra
e reclama a paz para a Terra

Quando uiva de saudade

Quando põe a nu a verdade
e denuncia a falsidade

Ou quando se dá ao desfrute
de nada dizer
em rima exaltada

É sempre de si
que o poeta fala

Mesmo quando de si
nada diz

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Abro a janela da alma e ponho-me a gritar





Refugio-me da chuva
neste frio dia de Inverno
do mês derradeiro
do ano
de tão triste engano

Grossas gotas de angústia
e desânimo
batem forte na vidraça

Vejo o meu país
em torpor
varrido por ventos
uivantes
de dor
e desgraça

Percebo mil imagens e ruídos
apelos doridos
gemidos
choros de crianças
que não conseguem adormecer

E ouço o povo
que a si mesmo se diz:
Para que lutar?
Melhor será deixar acontecer

Já se perdem as derradeiras esperanças

Sinto frio dentro de mim
tenho medo
assusta-me o futuro

Interrogo-me 
ainda assim
angustiado
de nariz colado
ao vidro
calado

Mas a mais não me aventuro

Já ninguém escuta ninguém
todos temos tudo a perder
já nada a democracia ressalva

Que poderei eu fazer?

Irracional
abro a janela da alma e ponho-me a gritar
de rompante:
- «Aqui, em Portugal
ou nos salvamos todos
ou ninguém se salva!
Portugueses!
Avante!»

Alguém me há-de escutar!

Vale de Salgueiro, terça-feira, 13 de Janeiro de 2009
Henrique Pedro

terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Éter e eternidade




Nem sempre só
e em silêncio
me sinto em solidão

Ruídos remanescentes
impedem-me de acordar
do vivo torpor
que é a vida

Os afectos que me ligam ao mundo
impedem-me de mergulhar
mais fundo

Ainda assim, no silêncio
melhor ouço o coração respirar
e o espírito mais livre a arfar
de amor

Mas só no silêncio
e na solidão
conheço o sucesso
e tenho acesso
ao meu ser

Só em silêncio
e na solidão
navego no éter
rumo a eternidade

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terça-feira, 1 de janeiro de 2013

É a poesia que me desperta




Que desejo
que dilema
que prazer de encantar
me fazem assim sonhar
despertado por um poema
em poesia a florir?

É a saudade dela
nua
dos seus beijos ardentes

É a Lua
coberta
de docilidade

São as estrelas luzentes
reflectidas no seu olhar
que assim me fazem fruir

Fazer amor com ela
de janela aberta
banhados pelo luar
me desperta

Não consigo mais dormir

Que desejo
que dilema
que saudade
que prazer de encantar
me fazem assim vigilar?

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