Seja bem vindo/a. A mesa da poesia está posta. Sirva-se. Deixe, por favor, uma breve mensagem. Poderá fazê-lo para o email: hacpedro@hotmail.com. Bem haja. Please leave a brief message. You can do so by email: hacpedro@hotmail.com. Well done.

domingo, 6 de março de 2022

Despaixão


Despaixão

 

Já não és mais a flor amorosa

viçosa

perfumada

 

A rosa inflamada pelo desejo despótico

que germinava no húmus erótico

dos nossos corpos juvenis

 

Já nem tu mesma sorris

só de te lembrares

 

És agora uma rosa estiolada

que seguro pelo pé

já sem fé

com cuidado

contudo

 

Não com medo de ser picado

mas porque sei que o mais delicado movimento

o mais suave sopro de vento

te fará despetalar

 

Foi o sopro

o cicio do tempo

perdido o cio

que colocou no vazio do meu coração

as pétalas da despaixão

 

Inexoravelmente

 

Já as pétalas te caem aos pés

 

Já nem eu sou

o que fui

 

É cruel

mas é

 

Até sempre

 

Vale de Salgueiro, sábado, 19 de Junho de 2010

Henrique António Pedro

 


 

sexta-feira, 4 de março de 2022

É longe demais o Além


O soldadinho chora


Chora lágrimas

suor

sangue

e saudade

capazes de o matar

embora

de nada lhe sirva chorar

 

Ainda assim o soldadinho

chora baixinho

calado

teme morrer

sem voltar

 

É longe demais o Além

para lá ir

e voltar

 

E sua mãe

em permanente oração

não pára de o chamar

para mais perto

do lar

 

Oh que apertado aperto de coração!

 

É longe demais o além

para lá ir

e voltar

Henrique António Pedro


terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

Nada, ninguém e mais alguém


Poderá ser só oxigénio e vapor de água

pairando etéreos sobre as colinas

arroteadas

em que medram videiras

rejuvenescidas

oliveiras prateadas

amendoeiras floridas no alvor da Primavera

 

Poderá ser só o suor

que o corpo transpira

e se evapora em diáfana nebulosidade

que reflecte e refracta com verdade

o vapor de amor

que do espírito se evola

e se transmuta em telúrica alegra

 

Poderá ser só o ar
que espírito respira

e pelos pulmões expele

condensado em bafo de poesia

 

Poderá ser só tudo isso

tudo que o poeta só

almeja

 

Vapor de amor e de água

também

nada que se veja

 

Mágoa de alguma alma enamorada

submersa na poética neblina

aspergida por aí

e por além

 

Poderá ser só nada

ninguém

e mais alguém

 

 Henrique Antóio Pedro

in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016)


quinta-feira, 27 de janeiro de 2022

Escreverei poesia até à hora da minha morte



É minha sina

é minha sorte

escrever poesia até à hora da minha morte.

 

Na hora de morrer

ouvir-se-ão os sinos da minha aldeia

tanger

poesia

e as aves e as flores

cantar-me-ao ao ouvido suas dores

para me consolar

 

E uma maior alegria

exultará a minha vida

no meu coração

na hora da despedida

 

E a odisseia de viver

dará lugar

à epopeia de renascer

acórdão de redenção

 

Não deixarei de escrever poesia

e de  amar

mesmo depois de morrer

 

Vale de Salgueiro, sábado, 27 de Agosto de 2011

Henrique António Pedro


sexta-feira, 21 de janeiro de 2022

A minha alma


Não é branca

ou negra

etérea

transparente

ou sequer vaporosa

a minha alma tal qual a sinto

 

É uma luz interior

cor-de-rosa

 

Um vórtice de amor dentro do meu ser que anseia tudo abraçar em redor

ao som de uma cósmica orquestra sinfónica

 

Uma vontade de congraçar a Terra inteira

o Céu

Estrelas e Galáxias

o Universo todo

e tudo devolver à vida

em explosão cósmica de amor e verdade

 

A minha alma tal qual a sinto e pressinto

mas não vejo

é um sopro de pensamento

um novelo emaranhado de afectos e pensamentos

um lampejo de eternidade

 

É uma radiação no cérebro que afago com a mão

 o pulsar do meu coração

 

A minha alma tal qual a sinto sou eu e são os meus eus

sem corpo

feitos vento

a voar

para Deus

universo adentro

 

Vale de Salgueiro, quinta-feira, 16 de Abril de 2009

Henrique António Pedro



segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

Cinderela


Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que gritava meu amor ao vento

Em jeito de lamento

Por dele não ousar falar a ninguém

Nem mesmo a ela

 

Respondia-me o eco

Repetitivo como um sino

Badalando o meu amor

Sem tino

Por montes e vales

Atribuindo ao meu triste destino

A origem dos meus males

 

Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que desenhava o meu amor na areia húmida

Da praia deserta

Feito criança

Na esperança de que lhe seria levado pelas aves

 

Mas vinham as ondas Uma a uma

Apagar os riscos fugazes

Devagarinho

E cobri-los com a sua própria espuma

 

Tanto eu amava aquela bela Cinderela

Que gravei o meu amor bem fundo

No tronco de um plátano secular

Certo de que a árvore confidente

Iria guardar o segredo para sempre

 

E ainda hoje quando por lá passo

Recordo atónito

Esse amor platónico

Afago a palavra “amo-te”

Gravada no tronco prateado

Dentro de um coração trespassado

Para enxugar as lágrimas de seiva

Que o plátano continua a chorar

 

E ouço o mesmo vento que me responde

Tangendo na ramagem silenciosa

Esta sinfonia chorosa

Sibilante de dor apesar do tempo

“Era no coração da bela cinderela que deverias ter gravado o teu amor”

 

Vale de Salgueiro, 2 de Janeiro de 2008

Henrique António Pedro

 

in Mulheres de Amor Inventadas

Copyright © Henrique Pedro (prosaYpoesia) 

1.ª Edição, Outubro de 2013