Seja bem vindo/a. A mesa da poesia está posta. Sirva-se. Deixe, por favor, uma breve mensagem. Poderá fazê-lo para o email: hacpedro@hotmail.com. Bem haja. Please leave a brief message. You can do so by email: hacpedro@hotmail.com. Well done.

domingo, 30 de junho de 2024

Adeus, adeus, adeus


Penoso era, para mim, seguir viajem

Para a outra margem

Do meu amado rio Rabaçal

Mal chegavam ao fim

As férias de Carnaval

 

Deixava por isso a folia

Com cara de quem partia

Triste, desencantado

Tendo pela frente o além

 

Era assim que me despedia

Quando a montada já seguia

Em passo estugado

 

Aperta, aperta!

O tempo escasseia

Fique para trás a aldeia

Adeus, adeus, adeus minha mãe

 

Até breve oliveiras cinzentas

Tristes, meigas e serenas

Minhas partidas são lentas

Pois me custa partir

Vendo as sombras das penas

A toldarem o porvir

 

Aperta, aperta!

O tempo escasseia

Fique para trás a aldeia

Adeus, adeus, adeus minha mãe

 

Vale de Salgueiro, Carnaval de 1959

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 28 de junho de 2024

O Universo é a minha prisão


Preso em prisão de paredes de pedra, de água e de ar

opacas, translúcidas, vaporosas

escuras, luminosas, ofuscantes

frias

escaldantes

crepitosas

 

Sem poder fugir para outro lugar

que não seja para dentro de mim

mergulho em mar de angústia

num oceano de dúvida

na dúbia sensação

deste angustiado aperto de coração

 

Enredado nas teias de Absoluto

tecidas do Infinito irresoluto

procuro entender a Verdade

e alcançar a Felicidade

na fé fugaz da Eternidade

 

O Universo é a minha prisão

cujas grades de dor e ilusão

tento em vão

forçar

com amor

e arte

 

Condenado à morte

forço a sorte

faço a minha parte

abro janelas de esperança

na minha mente de criança

 

Apenas sei

que só por Cristo Ressuscitado

poderei ser resgatado


Vale de Salgueiro, domingo, 12 de Dezembro de 2010

Henrique António Pedro

 

 

quarta-feira, 26 de junho de 2024

Dentro de mim não há céus nem infernos


Dentro de mim não há céus

nem estrelas

nem galáxias

nem infernos

 

Dentro de mim

sob a minha pele

há apenas ossos

músculos

vísceras

veias

nervos

e nada mais que releve

 

No meu coração flui apenas sangue

e não ódio

ou paixão

 

No meu cérebro nem uma agulha se intromete

tão pouco o vazio

o nada

de que nada sei

 

Mas dentro de mim abre-se uma janela larga para Deus

por onde o espírito

entra

e sai do meu eu

mesmo de olhos fechados

de ouvidos tapados

e de tacto entrapado

 

Deus mora dentro de mim

e não no Céu

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 6 de Dezembro de 2010

Henrique António Pedro 

in Introdução à Eternidade (1.ª Edição, Outubro de 2013)

 

 

domingo, 23 de junho de 2024

Ela pareceu-me um belo mote de poema


O olhar

o porte

o decote

as narinas ferinas

a formosura

a postura

ecoaram no meu espírito em  rimas ricas

deixando imaginar um belo mote de poema

talvez um perfeito soneto de amor

 

Até o “olá” com que se insinuou

me soou a verso de encantar

 

Seria ela a borrar a pintura

porém

 

Só os dois sabemos porquê

 

Que seja ela a contá-lo a toda a gente

mas só depois de ter lido este poema

 

É pena

 

Ela nada tinha de poesia

era tão somente fantasia

 

Qualquer poeta sabe que muitas vezes

é pior a emenda que o soneto!

 

Vale de Salgueiro, sábado, 3 de Setembro de 2011

Henrique António Pedro

quarta-feira, 19 de junho de 2024

Retrato de uma mulher qualquer


Airosa

de lábios cor de rosa

cintura adelgaçada

veste vestido encarnado

com decote bem decotado

e de manga arregaçada

 

Para a vida preparada

relógio no antebraço

trança atirada para a frente

muita coisas me diz de si

a mim

e muito mais

a muita a gente

 

Mesmo se seus lábios carnudos

sensuais

permanecem mudos

 

Quase tudo

ou quase nada

fica exposto

de permeio

neste seu público retrato

de corpo inteiro

 

Adivinho que não é uma qualquer mulher

 

Perscruta poemas

e amores

infindos

com seus olhos lindos

   que adoro vê-los

   mas  a mim não me ouve nem me lê

 

Ainda assim

coloco novelos flores

nos seus cabelos

já se vê


Vale de Salgueiro, sexta-feira, 7 de Agosto de 2009

Henrique António Pedro

 

terça-feira, 18 de junho de 2024

Ao deus-dará



Adrede

caminho a esmo

 

Deixo que seja o vento

a traçar-me o caminho

a tecer a rede

a tramar-me o destino

 

Avanço

assim mesmo

sem rumo

 

Ora por veredas que caiem a prumo

nas arestas da montanha

ora em terreno plano

 

Interno-me na floresta

do que me resta

de espírito lhano

 

A minha alma não sei por onde anda

à minha vontade

tanto se lhe dá

 

Caminho por aí

sem sair daqui

nem por ir além

 

Ao deus-dará

 

Vale de Salgueiro, quinta-feira, 14 de Outubro de 2010

Henrique António Pedro

In “Anamnesis” (1.ª Edição: Janeiro de 2016)

 

 

 

domingo, 16 de junho de 2024

E se Deus não existir?!


E se o homem não tiver sido criado

por Deus não existir

como creem os ateus?

 

Então

se pelo Cosmos tiver sido gerado

em cataclísmicos espasmos e pasmos

estará em apocalíptica gestação

um deus universal e eterno

senhor do céu e do inferno

ainda assim

 

E se esse deus sair do seio da Humanidade?

 

Se tal deus for assim…

um jogador de futebol

ou um nababo do petróleo?

 

Talvez…

um guru das finanças

um comediante

um político

um ilusionista?

 

E porque não uma deusa

uma cantora pop

uma estrela de cinema das revistas cor-de-rosa

retocada pela magia do Photoshop

loira

glamorosa…?

 

Em tudo isso terei relutância em acreditar

por mais cidadania que a Democracia proclame

por mais benefícios fiscais que me prometam

por mais partículas que a Física descubra

por mais genomas que a Biologia desvende

por mais loucuras que me acometam

por mais curas que Psiquiatria garanta

por mais luz que a Física Quântica induza

por mais…

que a minha brilhante mente reluza

 

Porque um deus assim não seria princípio

mas seria apenas fim

não seria um deus criador

mas somente um deus destruidor

 

Quando muito

darei o benefício da dúvida a um deus poeta

 

Poderei acalentar a esperança

de que o Universo tenha sido criado por mim

inadvertidamente

sem o saber

ao correr da pena

 

E sempre poderei corrigir o mundo

e a Humanidade

já no próximo poema

apagando tudo que é dor

 

Oh! Não! Poeta sim. Apóstata não!

 

Se Deus não existir

então

adeus amor

 

Vale de Salgueiro, sábado, 8 de Novembro de 2008

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 14 de junho de 2024

A Deus só agradeço as cerejas

 


O bom Deus vai ficar descoroçoado comigo

pela certa

mesmo zangado

talvez

mas eu só Lhe agradeço as cerejas

a Sua mais saborosa dádiva

agora que é tempo delas

 

Já O imagino a interrogar-Se e a questionar-me:

«Sou tão generoso contigo e tu só me agradeces as cerejas,

tu que até nem vives à míngua?!»

 

Mas eu, que tenho a resposta estudada na ponta da língua

respondo de pronto, sem ponta de aleivosia:

«Mais generoso sou eu, Senhor, que não Te pedi nada

e ainda assim Te agradeço as cerejas»

 

Mas Deus

como Ser infinitamente inteligente e bom que é

vai perceber que eu, para lá do Amor

que também é da minha responsabilidade

e depende mim

apenas agradeço aquilo de que gosto de Verdade

 

Na esperança de que Ele apenas me dê

coisas do meu agrado

já se vê

embora a minha fé

sem favor

vá muito para além de cerejas e palavras

 

Assim sendo

sou eu que a todos os poetas peço, entusiasmado

independentemente das igrejas

que louvem ao Senhor em seus poemas, com alegria

a dádiva da poesia

porque se os poemas são amores

é porque as ideias são como flores

e as palavras são como as cerejas

 

Louvado seja Deus!

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 5 de Junho de 2012

Henrique António Pedro

 

 

 

sexta-feira, 7 de junho de 2024

Em matéria de amor vou mais além



Nesta vida

na outra

noutras mais

se mais houver

 

Em matéria de amor

vou mais além

 

Guio-me por outra via

 

Procuro a verdade na poesia

ansiedade de eternidade

da minha alma razão de ser

 

Na calma desperta do meu viver

que releva a paixão

odor que o Espírito liberta

Amor Apocalipse

Amor Revelação

 

Vale de Salgueiro, domingo, 28 de Novembro de 2010

Henrique António Pedro

 


sábado, 1 de junho de 2024

E um dia simplesmente nasci

 


Não me lembro do acto em que nasci

do parto de minha mãe

nem por quem

fui assistido

 

Tão pouco sei se gozei

sofri

ri ou chorei

muito menos donde vim

da razão de assim ser

e de estar aqui

por ou sem querer

 

Quanto depois disso já vivi

sofri e amei

eu recordo

ainda assim a vida me sorri

nada tenho que esquecer

de nada eu discordo

 

Ah!

 

Mas gostava de me lembrar

do espírito que fui e veio encarnar

no ventre da minha mãe amada

no tempo e no espaço encantado

onde com tanta alegria

desabrochei em poesia

 

Gostava, sim, de me lembrar

de tudo que se passou

do que fui e do que sou

sem fantasia

 

Gostava mais de saber

do que ainda vou viver

mesmo depois de morrer

na esperança de não mais sofrer

o que já sofri

já se vê

 

Mas não!

Apenas sei que um dia

sem que saiba porquê

simplesmente nasci 


Vale de Salgueiro, quarta-feira, 26 de Setembro de 2012

Henrique António Pedro

 

domingo, 26 de maio de 2024

Nem a mim nem ao mundo eu entendo



A vida

é uma frustração

o Universo

pouco mais que um verso

o Cosmos

um caos indevido

 

Dor é aberração

e sofrer

uma contradição

 

O amor

é muito mais que uma flor

a Terra

dizem

um paraíso perdido

 

Eu

vagabundo

não caibo no mundo

e o mundo não cabe em mim

 

Apesar do muito que já vivi

amei

e sofri

continuo sem me entender

 

Nem a mim

nem ao mundo

eu entendo

ainda assim


Vale de Salgueiro, segunda-feira, 12 de Outubro de 2009

Henrique António Pedro

 

quinta-feira, 23 de maio de 2024

Poema pão

 


A todo o tempo

e por toda a parte

 

Em terras de amor

de vício

e de dor

onde a vida se reparte

 

Na paz ou na guerra

no ar, no mar e em terra

sempre um poema germina

uma seara de poesia cresce

e cobre os campos de fantasia

de alegria

de papoilas

de malmequeres

e porque não

de frutos silvestres

 

Até no pântano mais escuro e fétido

Lotus a flor luminosa

perfumada

floresce

esplendorosa

 

Não vive só de pão a Humanidade

também de toda a poesia

do amor e da verdade

de que se alimenta o coração

 

Vale de Salgueiro, sexta-feira, 4 de Dezembro de 2009

Henrique António Pedro