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sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Há roseiras a rosir


 

Há roseiras a rosir
agora pelo Outono
frágil entono
quando as romãs começam a rir
e os ouriços nos castanheiros
altaneiros
quase
quase
a parir

E as andorinhas
a partir

O céu
e os campos
ensaiam simulacros de Primavera
por todos os cantos
mas a cor dominante não é o verde fulgurante
pintalgado de papoilas e malmequeres
e da sensualidade desnuda das mulheres

São tons quentes de castanho
de folhas amarelecidas
que se vão desprendendo pelo vento
de árvores entristecidas
simulando alegria
em derradeiro arreganho
que é  lamento
elegia
pura poesia

Só as mães
depois que lhe morrem os filhos
não voltam mais
a sorrir

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Escrevelendo


 

Quando escrevo
leio
e quando leio
escrevo

Na mente
em segredo
não é devaneio
nem minto

Assim
num de repente
leio
releio
reescrevo
e transcrevo
a Natureza
o Cosmos
o que vai dentro de mim

Primeiro leio o que sinto
ou o que se passa à minha volta
e é o que leio
que escrevo
se me anima
acalma
revolta
ou induz estima

E sempre leio
e releio
o que escrevo
e também escrevo
quando leio
o que os outros escrevem

Leio
e escrevo na mente
ou no coração
embora não com a mão
o que os outros escrevem
para que eu leia
e que algo me diz a mim

Assim me enleio
a escrever
e a ler
em tudo que “escreveleio”

Não aprendemos a ler
primeiro
e depois a escrever

Sempre aprendemos a “escreveler”

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

O amor e a imaginação


 

Só pela imaginação
não vai a lado nenhum
o homem

Não chega sequer a sair
da sua própria mente

Só pelo amor
o homem sai de si
chega aos outros
os toma
e retorna

Só pelo amor penetra no seu ser
na sua razão de ser
aprende a amar
e a sofrer

Só pelo amor
desta arte
vai o homem
a toda parte

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Como pode a vida ter por fim a morte?


 

 

Como pode a vida ter por fim
a morte?

Ainda que o fim da vida
seja morrer?

Se viver
é uma caminhada interior
por mundos de dor
e de amor

Por espaços abertos
de ideias
e de afectos
a meias com o mundo exterior

É vencer montanhas de glória
de derrotas sem história
selvas de ambição
desertos de sonhos
pântanos de frustração

Sem se poder parar
ou sequer descansar
porque o coração não pára de bater
nem o cérebro de pensar
nem a alma de sentir

Se morrer é apenas desistir
de acreditar

E viver é libertar!

domingo, 28 de setembro de 2014

A arte de amar depois


 
 
A poesia
é a arte de amar
e sofrer
depois
sem querer
com fantasia

Mal a alma se parte
e reparte
depois que se perdeu
o amor
ou se deixou
de sofrer

É a música do silêncio
e da solidão
a pintura sem tintas nem pincel
a escultura sem pedra nem cinzel
o desenho sem carvão

E o poeta é o artista
que continua a sofrer
quando já não sente dor
no coração
e que tudo diz por poesia

É o amante à procura de mais amor
o malabarista
da alegria

A poesia
é a arte de amar
e sofrer
depois

A sós
a dois
a mais
sempre
nunca
ou jamais

 

Depois

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Mil virgens fatais




Tão curtos são os meus passos
tão frouxos os meus abraços
tão limitado o meu olhar
tão falível a minha mente
que duvido que algum dia
mesmo por fantasia
possa deixar de ser gente
e vir
a ser
deus                           

Anjo sequer

Muito menos se me fizesse deflagrar
fosse porque causa fosse
mesmo por uma só qualquer
mulher

E como poderia eu
tirar gozo de mil virgens fatais
num paraíso irreal
sem pernas
nem braços
sem pénis e sem beiços
com que as pudesse possuir
e amar?

Jamais

Nem mesmo imaginar

Trágico será 
imaginar
e sorrir

Vale de Salgueiro, sexta-feira, 18 de Fevereiro de 2011
Henrique Pedro


sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Apenas angústia e lágrimas para partilhar



Quando
e onde nasci
mum pequeno mundo rural
do Portugal
implantado na  Europa
por engano
ainda se bendizia a Deus
pelo pão de cada dia
se benziam as colheitas de cada ano
e se celebrava o seu sucesso com alegria

Porque se sabia quanto custava
andar um ano inteiro a mourejar
ao sol ardente
à chuva
ao frio
e à geada
para se conseguir o sustento
um naco de pão que fosse
arado, semeado, ceifado, malhado, moído, amassado, cozido
partido e repartido
com dor
amor
e suor
à força da enxada
e do timão

Mergulhou-se depois num mundo fácil
de frágil
e fugaz ilusão

Com demasiada gente que deveria chorar mas que cantava
e ria
por tanto ter que esbanjar
que adorava os falsos deuses que lhes punham a mesa farta
e do mundo da miséria os apartava
mas lhes encondia a verdade

Agora
são milhares os seres humanos que não têm que comer
nem deuses a quem agradecer
e que apenas têm lágrimas
para partilhar!

Mais a angústia de não saber que fazer

Agora
mais do que nunca

tem sentido a palavra solidariedade

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

Qual o destino dos sentimentos?



Qual o destino dos sentimentos
sobretudo dos afectos mais fortes
dos maiores amores
ódios
rancores
sobretudo daqueles que não dirimimos
e nos fazem andar dias e dias a sofrer
noites e noites sem dormir?

Acontece-lhes o mesmo que às pétalas inúteis das flores
que empalidecem até secar
com o perfume a diluir-se até deixar de ser aroma
e pés e espinhos a apodrecer
até deixarem de magoar
e de fazer sofrer

Mas não são lançados à terra
nem se transformam em húmus
não se reciclam em novas flores
em novas pétalas
novos espinhos
novos ódios
novos rancores
novos amores
novos perfumes

Convertem-se em inócuas lembranças
que o tempo lentamente faz atenuar
até acabarem por entrar em torpor
e definitivamente
se esquecer

Para que o espírito se possa
revelar
em amor
o destino dos sentimentos é se desvanecer

até morrer

quinta-feira, 31 de julho de 2014

O futuro do rio é o mar



Sobrevoo
vales velados de nuvens
por onde corre o rio
do destino
sendo certo que o seu futuro
é o mar

Acima de mim
o céu

Pesado
plúmbeo

De chumbo

Não rio
nem ouso pousar
em nenhum lugar

Assim vou continuar a voar
até me diluir
com poesia
numa gota de chuva
feito lágrima
de alegria

Na esperança de que o calor
do amor

me fará evaporar

terça-feira, 29 de julho de 2014

Não só no meu peito o meu coração bate



Não só no meu peito
o meu coração bate

Bate em toda a parte
em que ponho os olhos
ou os ouvidos
ou lanço a imaginação
alcance ou não
as coisas
com a mão

Bate em tudo que tacteio
em tudo que toco
com os sentidos
ou simplesmente anseio

Vá para onde eu vá
sempre lá estará
o meu coração a bater
assim
profundo
de permeio
entre mim
e o mundo

Bate também no peito de quem
também tem
um coração por mim
a bater

Bater a marcar o ritmo do meu amar
do meu sofrer
do meu prazer

E tanto assim é
que é minha fé
que mesmo depois de morrer
o meu coração

vai continuar a bater

sábado, 26 de julho de 2014

Daqui, da eternidade



Arrasto comigo o infinito
e a eternidade
para onde vou

Aqui onde estou
e no tempo em que vivo
é onde o infinito se inicia
e a eternidade começa

Vivesse noutro tempo
em qualquer outro lugar
com ar para respirar
e cérebro para pensar
sentiria a mesma sensação
o mesmo aperto de coração
o mesmo lapso de Razão

Existo
por isso
no Infinito

Moro na eternidade


in “Introdução à Eternidade” (revisto)

sexta-feira, 25 de julho de 2014

Deus não é nada disso






Quem sou eu para determinar
o que Deus é
ou não é?

Atrevo-me a supor, até
que Deus não é nada disso
nada do que Dele dizem

No meu entendimento
Deus
não é nada disso
não é coisa nenhuma
nem criou nada
nem ninguém
porque tudo existe
Nele

Deus
não é nada do que Dele dizem

Bom ou mau
protector
misericordioso
justo ou injusto

Tão pouco é eterno
porque em Deus não há passado, presente ou futuro
e a eternidade começa na hora da morte
quando o tempo para

Deus
não é nada do que Dele dizem
não é nada disso

Não é o que Dele dizem os filósofos
os cientistas
os teólogos

Deus não é nada do que Dele dizem
nem existe
sequer

Deus apenas É


Deus é Aquele de que falam os místicos
os anjos
os santos

É o que nos diz o nosso coração

sempre que sente amor

quinta-feira, 17 de julho de 2014

A mim, Deus, apenas me deu …



A mim
Deus
apenas me deu pernas e braços
o corpo
e o sopro da vida
que passei a ser eu
a soprar

O espaço para viver
e sonhar
terei que ser eu
a porfiar

Resta-me o desejo angustiado
de ser grande
bom
e verdadeiro

Por isso me parto
e reparto
na ânsia de ser inteiro

A outros
Deus
deu mais

E a muitos nem tanto

Muitos talvez se sintam aptos
e capazes de dominar o mundo
a sorrir

Outros apenas encontrarão razão
para o destruir

Eu, não!

Tento apenas
fazer valer
o meu coração

É por isso
que tanto

me apoquento

quarta-feira, 16 de julho de 2014

Reflectindo sobre a vida à hora em que já são horas de jantar





Mais um dia
uns tantos quantos momentos
com predisposição para a pensar na vida

A sério

Venho fazendo isto
quase sistematicamente
desde que me dei conta que sou gente
embora aparentemente
nos outros dias
não deixe de reflectir

Sem nada
até hoje
poder concluir

Talvez desta vez chegue a uma conclusão
quanto mais não seja que tudo está fora
do alcance da Razão

Mas eu não sou agnóstico confesso
e até professo a doutrina de Cristo

Embora sinta
por vezes
vontade de me rebelar
de mandar tudo à merda
e considere pura perda
estar assim a me martirizar

Mas acabo sempre por me humildar
por caminhar sem tino nem destino
de cabeça cabisbaixa
ao sabor do vento
por caminhos traçados por montes e vales
inteiramente mergulhado na Natureza
e subjugado às forças telúricas e cósmicas
que assim livres melhor se fazem sentir sobre mim
impondo-me o seu norte


À hora em que já são horas de jantar

É então que sinto o estômago falar mais alto que e Razão
e no coração melhor ouço a voz interior
que me segreda que a minha mente é sim insuficiente
demente
mas que não me importe

No coração palpita o espírito
que acende um calorzinho interior a que se chama amor

E aí
sem ter que pensar
encontro resposta para tudo


Até para a morte