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quinta-feira, 20 de maio de 2021

Oremos

 


Se a vida é assim tão breve

e tão curto o espaço em que nos é dado viver

e morrer

 

Se Aquele que nos criou

nos condenou

a vivermos breves anos apenas

num ponto perdido num canto do Cosmos

 

É porque o infinito

não é assim tão distante

nem a eternidade assim tão demorada

 

Nem para lá chegar será necessário tanto tempo

tão angustiado pensamento

nem tão imerecida

sorte

ou dó

 

Bastará viver a vida

com naturalidade

tão só

 

E ter fé

 

Transpor as portas da morte

pela via do amor

ao som da verdade

e orar

sem nos  equivocar

 

Jesus Cristo ressuscitou dos mortos como previsto

só Ele nos poderá dizer

como morrer

e ressuscitar

 

Oremos!

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 6 de Agosto de 2012

Henrique Pedro

 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Vou ali e já volto



Vou ali

e já volto

 

Ali

ao virar de uma esquina da vida

a um qualquer sítio da Internet

que promete

a uma terra prometida


Vou comprar fósforos
tabaco
e o jornal

Sal para temperar o jantar
que o que havia esgotou

Podem ir comendo a sopa
e a comida que está na copa


Não me demoro
embora não saiba bem

aonde

por onde

e nem ao que vou

Talvez procurar uma mulher que me chame

me ame
e a quem amar

Poderei tropeçar num sonho
num simples poema
qual o problema?

Podem ir comendo a sopa
preciso mesmo é de apanhar

ar

de sair daqui para fora

 

Não será demorada
a minha demora

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 2 de Junho de 2009

Henrique Pedro


sábado, 8 de maio de 2021

Quem sou, não sei, nem sou


Sou

isso sei

fogo-fátuo

fagulha a cruzar o céu da vida

e do mundo

por entre miríades de estrelas

 

Um grão de areia perdido no areal

de uma praia sem fim sem ser eterna

 

Uma bolha de ar que rebenta

na espuma efémera

quando as ondas do mar deixam de bater

as arribas

ou os desejos de amar arrefecem

 

Uma folha que vicejou

e acabou por tombar

amarelenta

levada no vendaval

por entre milhares de folhas iguais

e que o jardineiro a arrasta para o monturo

pelo Outono

 

Sei que não viverei sempre

ainda assim vivo para sempre

 

Sem limites

porque o meu limite

está além do Universo

do verso do sentir

do reverso do devir

da razão do dever

e do ter que ser

 

Quem sou

não sei

nem sou 

 

Introdução à Eternidade

Copyright © Henrique Pedro

1.ª Edição, Outubro de 2013


quinta-feira, 6 de maio de 2021

A minha luta interior


Há momentos em que duvido de tudo

e não acredito em nada

nem mesmo em mim

nesse ínterim

 

Mormente se assisto impotente

ao tormento de inocentes

 

Momentos em que duvido de Deus

e dos anjos

dos homens

e do diabo

ao fim e ao cabo

 

Do corpo e da alma

do além

e da vida eterna

também

 

Do que vejo e ouço

do que sinto

e do que pressinto

 

Momentos em que não sei distinguir

a mentira da verdade

em que não acredito na felicidade

nem sei que caminho seguir

onde me refugiar

ou para onde fugir

 

Momentos em que uma só certeza me salva

porém

 

Uma luz interior

que me ilumina de uma certa fé:

A evidência do amor

imanência do bem

 

Por isso ter fé, não é

para mim

acreditar

 

É antes travar essa luta

interior

e apesar da dor

continuar

de pé

 

Ainda assim

 

 

in Introdução à Eternidade

1.ª Edição, Outubro de 2013

Copyright © Henrique Pedro (prosaYpoesia)


 

domingo, 2 de maio de 2021

Crónicas Secretas do Afeganistão XIII Poema lamento de uma mulher afegã

 


(Imagem: Pinterest)

Crónicas Secretas do Afeganistão

XIII

Poema lamento de uma mulher afegã

 

Quem me dera poder postar os meus poemas

E dar a conhecer ao mundo

Livremente

Os meus dilemas

Fazer ouvir a minha voz

Por toda a Terra

Ainda mais alto que os terríveis acordes de guerra

 

Quem me dera poder amar e ser amada

Viver o dia-a-dia e ver o dia

Como uma repetida madrugada

Liberta de véus e de vendas

Das leis horrendas

Que me convertem em vil

E abjecto

Objecto

 

Quem me dera poder ser possuída por amor

Sem ser posse de ninguém

E de ter alguém a quem ter

Sem correr o risco de morrer

 

Quem me dera poder banhar-me no mar

Desnuda

E correr pela praias

Livre das minhas saias

 

Quem me dera poder namorar nas noites de luar

Deitada na areia

Nua como a Lua

Ser dona do meu corpo

E poder correr o risco de engravidar

Sem me sentir constrangida a abortar

 

Oh, como eu gostava de poder sonhar!

De ousar ser livre

De contestar o profano e o divino

De criar e procriar

Votar

Viajar

E ser dona do meu destino

 

Por agora sou apenas mulher

E não sou nada

Nem ninguém

 

Mas um dia serei mais que mulher

E serei tudo

E serei mãe

 

Afeganistão, Ponto GPS Cabul, 30092005

Daniel Rio Livre (Repórter de guerra fictício)

 

Apostila:

De regresso a Cabul gozo um período alargado de folga. Tive ensejo de me encontrar com Elif no complexo da base em que estou aquartelado, sem ser, portanto, no decorrer das missões arriscadas que nos são atribuídas.

Falámos de tudo e com alguma surpresa da minha parte, Elif pediu-me que verte-se para português e postasse, o poema que acima se apresenta.


quarta-feira, 14 de abril de 2021

Indira



Encontrámo-nos por curioso acaso

quando observávamos em simultâneo

e religioso silêncio

as esculturas eróticas do templo Jagannath

bem no coração da mítica Katmandu

 

Fitámo-nos com fugaz e instintiva malícia

mas ela afastou-se num ápice

rodeada pela colorida e vaporosa comitiva

mal se deu conta da matéria herética

dos meus impensados pensamentos

 

Andávamos por ali em busca de espiritualidade

levados nas asas da mais pura fantasia

mas acabaríamos em mútuo despertar

nu e cru

nos deleites de uma nova virtude

por força do viço da juventude

e dos encantos do verdejante vale de Katmandu

 

Indira era uma linda, tímida e sanguínea

viúva semi-virgem de um machucho lambão

que mal tivera tempo de a lambuzar

nem sequer de lhe tocar o coração

 

Eu vivia a ventura da livre aventura

cultivava a mais sã inocência

cruzava oceanos e continentes de continência

e abstenção

na ideia de que assim seria mais livre

forte e feliz e são

 

Indira não despertara ainda para a vida

e trazia um cosmos caótico dentro de si

 

Era uma mágica poção de virtude e paixão

envolvida por véu diáfano de santidade

e aspergida de inebriante perfume de sensualidade

 

Por dentro e por fora era a um só tempo

doce templo de artifício e religião

fascinante fogo de amor e tentação

 

Tornámos a encontrar-nos nesse mesmo dia

por curioso acaso

no átrio do hotel em que nos hospedáramos

na edénica cidade-lago de Pokhara

bem no coração do mítico vale de Katmandu

 

Bastaria agora o meu sorriso discreto e sedutor

em resposta ao seu olhar doce, tímido e tentador

carregado de indizível e oriental fascínio

para me franquear as portas da sua suíte de sonho

que em segredo se abriam amplas de luxúria

sobre as águas plácidas do lago Phewa

iluminadas pelo irreal albedo da neve e do luar

que igualmente doiravam

o seu triste e solitário degredo

 

Com um sorriso de universal feminina sedução

convidou-me a penetrar no seu reduto mais íntimo

discreta e delicada como se me levasse pela mão

 

Aventurei-me inflamado de desejo

inebriado de amor e despido de adrenalina

com a libido em calada combustão

confiante nos desígnios daquela fêmea divina

certo de que seria aquela a noite mais prazerosa

de todos os contos cor-de-rosa

que nem mesmo Sherezade ousara tanta magia

tão deleitosa veracidade e fantasia

 

Permanecemos durante longo tempo

em mútuo e sereno jogo de prazer

nus e melados

deliciados

no fascinante desconhecimento

que cada um tinha do outro

e nem os meus beijos mais apaixonados

nem as minhas carícias mais meigas

pareciam fazê-la rir de prazer como eu pretendia

e abrir-se em toda a sua pureza e verdade

mais parecia mergulhada num etéreo manto

de poética e distante frialdade

 

Apenas quando o meus dedos delicados

ousaram titilar o seu mimoso e melífico clítoris

explodiu então Indira lasciva e langorosa

que nem uma feroz fêmea loba faminta

descida do mais profundo e recôndito fojo

da mais cerrada floresta dos Himalaias

e se pôs a lutar por se dar por vencida

a gritar desmedia que era minha

que eu a poderia possuir e ousar fazer tudo

que a tudo se prestaria e a mais lhe apetecia

 

Quando por fim saciados

e ainda apaixonados por nós

e pelo ambiente de paz e deleite que nos envolvia

eu concluí para dentro de mim

sem nada lhe dizer todavia

que a não amava

 

Por certo

ela pensou o mesmo dentro de si

sem nada me dizer

porque mil vezes me agradeceu

solícita e esmerada

a sublime loucura que lhe propiciara

 

Talvez também porque inexoravelmente

cada um teria que regressar ao seu próprio mundo

de diferentes e afastados continentes

 

E porque aquele sublime acto de amor e sexo

fora imprevisto e não poderia acontecer novamente

já que a nossa vida em comum era imprevisível

e não teria qualquer nexo

 

Passadas que são décadas de doce esquecimento

recordo agora aquele sublime congresso

e concluo que afinal a amei e a amo ainda

também porque a sei agora mulher feliz

e de planetário público sucesso

sublimado produto por certo

da sua erotomania juvenil

 

Agora que coloco este poema memória na Web

e que nada lhe devo e ela nada me deve

talvez Indira acabe, sem querer, por lê-lo

sozinha no seu íntimo silêncio

 

E talvez de novo se acenda

nos seus olhos verde-esmeralda

o brilho carente de feroz fêmea loba dos Himalaias

num ápice semicerrados para o efeito

 

E talvez

como eu

acabe por guardá-lo no seu mais íntimo jardim

e segrede para si mesma

que afinal também ela ainda me ama como me amava

embora nada saiba de mim

 

 in Mulheres de Amor Inventadas ( 1.ª Edição, Outubro de 2013)


Vale de Salgueiro, domingo, 5 de Abril de 2009

Henrique António Pedro

Imagem (Google Image)