domingo, 20 de maio de 2018
Encantamento d’alma
segunda-feira, 14 de maio de 2018
Urinando em formigueiros e tocas de grilos nos lameiros
É uma minha boa lembrança
de criança malvada
mijar em formigueiros
e tocas de grilos
nos lameiros
Não terei sido eu
o primeiro
a inventar tamanha
maldade
Fazia até uma
tremenda ginástica
para acertar, de pé, nas tocas dos grilos
e nos carreiros dos formigueiros
por falta de
prática
Ainda era menino
de calção
mas só desistia quando
sentia
que uma formiga me
picava os testículos
e uma multidão de
insectos desafectos
me perseguia no
carreiro
Então
qual poeta
proscrito
aflito
proferia a
palavra mais obscena do presente poema:
- Foda-se!
e fugia
Foi assim que aprendi
que há uma
infinidade de espaço no Universo
onde poderei
urinar à vontade
um simples verso
que seja
sem importunar
uma formiga por
demais pequenina
que mal se veja
Vale de
Salgueiro, domingo, 5 de Abril de 2009
Henrique António Pedro
sábado, 12 de maio de 2018
Transmontana Nostalgia
Transmontana Nostalgia
(Revisto)
In Poemas da Guerra,
de Mim e de Outrem (Editora Piaget-2000)
Caminhei descalço no restolho afiado
Resto triste dos fugidios trigais
E nos olivais sombrios
Procurei ninhos de doirados pintassilgos
A quem fartar de painço e prisão
Em troca de uma menos triste canção
Senti os pés escaldar no pó fervente dos caminhos
À torreira do sol do meio dia
Que secava figos em fragas arredondadas
À hora em que nem um só pio se ouvia
E dos rostos caíam gotas de suor salgadas
Ouvi a passarada cantar alegre
No espaço verde da devesa
E invejei-lhe a liberdade
Chamei pela matilha em agudos assobios
E ouvi o latir do galgo que célebre persegue a lebre
E o estampido do tiro que pronto a fere
Segui o voo soturno das rolas mansas
Defronte da minha escopeta
Quando já das cerejas só restavam passas
E mãos calosas agarravam palhas ásperas
Que depois de mil martírios iriam encher o celeiro
Dei caminho à água fresca nos regos do milho a estalar
E senti melões e melancias a inchar de Sol e húmus
Cantei romances pela segada e debiquei as uvas pela vindima
Namorei raparigas rosadas a cantar cantigas cristalinas
Nas manhãs louçãs de Primavera
Apanhei amoras nos silvedos quando já o bago pintava
E nas noras metálicas se apreciava a água
Tornei-me ousado a trepar alcantilados rochedos
Cresci são a respirar ar puro
E adorei a beleza cristã de papoilas e malmequeres
Não temi o Inverno rigoroso
Sorvi a neve
E o meu peito foi mais forte que a geada
Adorei Cristo em cada mendigo andrajoso
Que no primeiro degrau da escada
Rezava humildes Pai-nossos
Enquanto minha mãe condoída
Lhe enchia de azeite a lata
Armei o Presépio pelo Natal
Joguei ao rapa pela Consoada
Pus máscara pelo Carnaval
E botei o pião pela Quaresma
Senti
Em mim
O toque das Ave-marias
Quando pelo findar do dia
O arfar quente da terra fez de mim poeta
E calado vi descer a noite no fumo diáfano da aldeia
Em visão bíblica de deserto e oásis
Sorvi o caldo quente com a religiosidade de meus avós
E na lareira rubra encontrei doce temperança
Para os músculos doridos
Um dia emigrei e não desertei
Quando ademais fui a pátria defender
Sem nas terras distantes esquecer
O meu país e os meus pais
Porque vivo com vida
A vida de cada ano
Sou
E sempre serei
Transmontano!
Nangade (Cabo
Delgado-Moçambique), 6 de Outubro de 1972
Henrique António Pedro
Leia mais no link
seguinte:
https://henriquepedro.blogspot.com/2018/05/transmontana-nostalgia.html
sexta-feira, 4 de maio de 2018
Quando a minha sombra mais se alonga
terça-feira, 1 de maio de 2018
Amorável, doida, doída, dorida, nonsense.
Por mais que se pense
ou não pense
se diga ou se fique calado
extasiado
a olhar o céu
a poesia é o que é:
Nonsense
É a arte do utópico
dos picos da paixão
e de outros males do coração
das indefiníveis estéticas
amor sem dor
é utopia
É génese de religiões
ainda que Amor e a Fé
não sejam meras construções
poéticas
Melhor que nada, que outra coisa nenhuma
a poesia nos inuma na tristeza
nos liberta do real
nos desperta
nos afunda nas raízes profundas do ser
daquilo que verdadeiramente é
nos despoja do ter e do haver
mais nos aproxima do bem
e nos afasta do mal
A poesia
é como a vida é
amorável
inexplicável
irracional
doida
doída
dorida
nonsense
Vale de Salgueiro, 12 de Novembro de 2007
Henrique António Pedro