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sexta-feira, 18 de junho de 2021

O mais certo é eu não ser eu e ser outro


Poderei ser eu mesmo, sim

e não ser mais ninguém

ainda assim

 

Poderei ter-me assumido, assim como sou

ainda no ventre de minha mãe

 

Mas pode dar-se a coincidência, também

de eu ser outro

em coexistência  com o eu que agora sou

 

Eu

um outro

ninguém

algum

ou nenhum

 

Neutro

 

Um pensamento impróprio

para consumo comum

 

O mais certo, portanto

será

quiçá

eu não ser eu

ser outro

que se ilude a si mesmo

e me engana a mim próprio

entretanto

 

Um encanto

 

Um outro que já fui

mas já não sou

 

Um outro que poderei vir a ser

mas ainda sou

 

Um outro que serei se o for

 

Um outro eu

muitos mais

ou talvez nenhum

 

O mais certo é eu não ser eu e ser outro


Vale de Salgueiro, domingo, 13 de Setembro de 2009

Henrique António Pedro


 

sábado, 29 de maio de 2021

À janela à espera da próxima revolução



À janela à espera da próxima revolução

 

Foi a vida ou talvez não

 

Talvez o Governo sem noção de Nação

que lhe atou os pés e as mãos

lhe abafou o coração

a deixou louca

 

Não lhe vendou os olhos

nem lhe tapou os ouvidos

nem lhe calou a boca

e demais sentidos

 

Continua a ver

a ouvir

a falar

atenta ao mundo

embora sem nada mais poder

por agora

que fazer

 

Esta mulher à janela é o retrato da Nação

 

Mergulhada no conformismo desconcertante

de amargura instalada no coração

angustiada

a esperança a mantém acordada

vigilante

 

Foi a vida ou talvez não

 

Talvez o Governo sem noção da Nação

 

Está atenta

à janela

preparada para o que der e vier

à espera da próxima revolução

 

Que venha ela

 

Já!

 

Mas que seja de amor

de verdade

 

De salvação!

 

Vale de Salgueiro, quarta-feira, 18 de Agosto de 2010

Henrique António Pedro



quarta-feira, 26 de maio de 2021

Onde é o além?


Deito-me

em decúbito dorsal

relaxado

livre do bem

e do mal

 

Envolto em perfeito silêncio

e escuridão

os olhos fechados sem nada ver

os ouvidos sem nada ouvir

sem sentir o coração bater

nem me dar conta de respirar

nem do tempo fluir

 

Sem me afectar a mais leve emoção

no  presente

a mais ténue saudade

do passado

a ansiedade mais débil

do futuro

 

De memória desmemorizada

de nada

e a consciência em total ausência

de tudo

 

Com o cérebro a “cerebrar”

que não a pensar

e que tento também, em vão

parar

 

Acabo por acordar

e deixar de sonhar

 

Num sopro saio do corpo

 

Passo a tudo ver

ouvir

e sentir

 

Fico sem saber

porém

para aonde ir

nem onde é o além

 

 

 

in Anamnesis

Copyright: Henrique António Pedro

1.ª Edição: Janeiro de 2016

 

quinta-feira, 20 de maio de 2021

Oremos

 


Se a vida é assim tão breve

e tão curto o espaço em que nos é dado viver

e morrer

 

Se Aquele que nos criou

nos condenou

a vivermos breves anos apenas

num ponto perdido num canto do Cosmos

 

É porque o infinito

não é assim tão distante

nem a eternidade assim tão demorada

 

Nem para lá chegar será necessário tanto tempo

tão angustiado pensamento

nem tão imerecida

sorte

ou dó

 

Bastará viver a vida

com naturalidade

tão só

 

E ter fé

 

Transpor as portas da morte

pela via do amor

ao som da verdade

e orar

sem nos  equivocar

 

Jesus Cristo ressuscitou dos mortos como previsto

só Ele nos poderá dizer

como morrer

e ressuscitar

 

Oremos!

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 6 de Agosto de 2012

Henrique Pedro

 

quarta-feira, 12 de maio de 2021

Vou ali e já volto



Vou ali

e já volto

 

Ali

ao virar de uma esquina da vida

a um qualquer sítio da Internet

que promete

a uma terra prometida


Vou comprar fósforos
tabaco
e o jornal

Sal para temperar o jantar
que o que havia esgotou

Podem ir comendo a sopa
e a comida que está na copa


Não me demoro
embora não saiba bem

aonde

por onde

e nem ao que vou

Talvez procurar uma mulher que me chame

me ame
e a quem amar

Poderei tropeçar num sonho
num simples poema
qual o problema?

Podem ir comendo a sopa
preciso mesmo é de apanhar

ar

de sair daqui para fora

 

Não será demorada
a minha demora

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 2 de Junho de 2009

Henrique Pedro


sábado, 8 de maio de 2021

Quem sou, não sei, nem sou


Sou

isso sei

fogo-fátuo

fagulha a cruzar o céu da vida

e do mundo

por entre miríades de estrelas

 

Um grão de areia perdido no areal

de uma praia sem fim sem ser eterna

 

Uma bolha de ar que rebenta

na espuma efémera

quando as ondas do mar deixam de bater

as arribas

ou os desejos de amar arrefecem

 

Uma folha que vicejou

e acabou por tombar

amarelenta

levada no vendaval

por entre milhares de folhas iguais

e que o jardineiro a arrasta para o monturo

pelo Outono

 

Sei que não viverei sempre

ainda assim vivo para sempre

 

Sem limites

porque o meu limite

está além do Universo

do verso do sentir

do reverso do devir

da razão do dever

e do ter que ser

 

Quem sou

não sei

nem sou 

 

Introdução à Eternidade

Copyright © Henrique Pedro

1.ª Edição, Outubro de 2013