À ida
deixo poemas
suspensos no ar
e os rastos dos meus passos
impressos no pó do caminho
À volta
já a brisa do fim da tarde
lhes deu descaminho
desemaranhou os dilemas
e alisou as arestas dos rastos
Outros transeuntes vieram
os pisaram e deformaram
mas seria a chuva telúrica
a apagá-los definitivamente
dissolvendo o pó em lama
Poderiam ser maciços graníticos
piramidais
anónimos
erigidos no deserto
que teriam o mesmo fim
embora mais lenta fosse a agonia
ou mais funda a chaga
ainda assim
Mas os meus poemas têm o meu rosto
são os rastos indeléveis dos meus passos
que ninguém que preste
apaga
mesmo se os ignora
e não lê
Encontram-se
permanentemente
a perderem-se
na imensidão do Cosmos
e só o vento celeste
os dilui em eternidade
in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro
de 2016)