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segunda-feira, 29 de setembro de 2025

Outono



Perde o Verão o entono da paixão

a partir do nono

mês

quando o Outono sazão

faz valer o brilho

da sua palidez

 

As andorinhas

ladinas

rumam para sul

o silêncio tomba

no paul

 

O rebanho deserta

da sombra do negrilho

onde dormia a sesta

em busca de erva tenra para tosar

nos campos já a verdejar

 

Diga-se em abono da verdade que o Outono

com sua morna cor

é uma festa

com bandos de folhas de esquecimento

a voarem pelo ar

tocadas pelo vento

da saudade

 

É tempo de sonhar

sonhos mornos de amor

doce forma de amar

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 24 de Setembro de 2012

Henrique António Pedro

 

 

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

O Douro do meu enamoramento



Um cálice de vinho bastou para me embriagar

e por ela e pelo rio me enamorar

e um cálice de tempo

para transformar o Douro

no rio do meu enamoramento

 

Agora é o espírito das águas prateadas

e a lembrança do seu olhar

que continuam a me inebriar

 

A memória de quando descíamos os socalcos ciclópicos

aos saltos

eufóricos

 

E depois que nos banhávamos naquele rio dourado de amor

ainda tínhamos forças e vontade

para mil vezes voltar a subir e a descer

desde o nascer ao sol pôr

até o sol desaparecer

nas nuvens do sonho

 

Só quando ganhámos asas

nos despedimos

e dissemos adeus

 

Torno aqui e lá agora por acaso

 

Sem saber que é feito dela

nem por onde ela anda

sabendo apenas

que aqui e lá já não se encontra

 

Nem ela

nem eu

nem eu a ela

nem ela a mim

 

Apenas esta doirada saudade

apaladada pela doçura do mosto

bebido no olhar e no rosto

daquela minha casta namorada

 

Eu

para ela

já nada sou

por certo

 

Nem lembrança

sequer

muito menos ela saberá se moro longe ou perto

 

De novo me despeço

e desapareço

nas nuvens do tempo

levado nas asas do vento

enquanto as águas da memória corram tranquilas

no rio Douro do meu enamoramento

 

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 7 de Dezembro de 2009

Henrique António Pedro

 

(Imagem Google)

 

 

segunda-feira, 22 de setembro de 2025

Valquíria Sigrdrifa


in Mulheres de amor inventadas (1.ª Edição, Outubro de 2013) 

 

Sinto-lhe o sopro

Finjo-me morto

 

Beija-me a pele

Besunta-me de fel

 

Beija-me os pés

Para mos decepar

 

Beija-me as mãos

Rói-me os dedos

Rouba-me os segredos

 

Beija-me os ouvidos

Para me ensurdecer

 

Beija-me a boca

Para me emudecer

 

Beija-me o sexo

Para me capar

 

Beija-me o coração

Exangue

Chupa-me o sangue

 

Beija-me os olhos

Para as lágrimas

Me sugar

 

Beija-me a face

Para me desfigurar

 

Está escrito

Resisto

 

Beija-me de morte

Sem me matar

 

Quer-me vivo

Nem morto nem vivo

Seu quero ser

 

Vá para onde eu for

Sigrdrifa me persegue

Com ardor

 

Beija-me a alma

Sugar-me o espírito

Não consegue

 

Sou um guerreiro invicto

Jamais um proscrito

 

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 10 de Agosto de 2010

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 19 de setembro de 2025

Saudades saudosas



Hoje

sem querer

dei comigo a lembrar

pessoas que conheci

e não voltei a ver

 

Terras de encantar por onde passei

ou fugazmente vivi

e aonde não tornei

 

Locais da selva onde acampei

campos de batalha onde combati

praias em que me banhei

templos em que orei

desilusões que sofri

 

Amores a que não fugi

outros tantos que evitei

para mais não sofrer

 

Sonhos do passado

que teimam ser sonhados

por não quererem morrer

 

Sítios de magia

repositórios de História e fantasia

almas a quem me irmanei

em campanha inglória

 

Aventuras cor-de-rosa

que não quero esquecer

que relembro com saudade

neste poema de amizade

a florir

 

É uma minha forma de amar

de verdade

e sofrer

com poesia

 

São saudades saudosas

a teimar

em não partir

 

 

Vale de Salgueiro, domingo, 26 de Abril de 2009

Henrique António Pedro

 

in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016)

 

segunda-feira, 15 de setembro de 2025

“AMO-TE”



Há mil formas de declarar o nosso amor a alguém

sem dizer “amo-te”

ou fazer uso de qualquer outros modos e tempos do verbo amar

 

Poderemos mesmo dizê-lo sem proferir a palavra “amor”

e ao arrepio das regras gramaticais

ainda mais

e melhor

 

Se assim não for

como poderão os surdos-mudos

dizer “amo-te”

às suas apaixonadas?

 

Ou os amantes de língua chinesa

declarar o seu amor

às suas namoradas de outras línguas

que não entendam o mandarim

nem conheçam um só carácter chinês?

 

Há mesmo

muitas outras formas de dizer “amo-te”

sem ter que escrever

abraçar

ou beijar

 

Poderemos dizê-lo com o olhar

oferecendo uma flor

dedicando um poema

ou simplesmente ficando em silêncio ao lado de quem

a quem

queremos dizer

“amo-te”

 

De resto a palavra “amo-te”

já está tão gasta pelo uso

que perdeu a originalidade

quiçá

a autenticidade

 

Poderá ser até um abuso

aleivosia

despudor

 

como vês

muitas outras formas de dizer “amo-te”

sem do verbo amar fazer uso

 

Como continuar a escrever poesia

Apenas por amor

 

Vale de Salgueiro, domingo, 7 de Março de 2010

Henrique António Pedro

 

 

quinta-feira, 11 de setembro de 2025

UM POEMA DE AMOR AGRIDOCE


(Imagem Google)


Os meus passos perdem-se

na manhã fria de Janeiro

o meu bafo é cansaço

envolto em nevoeiro

 

Na montra da pastelaria

bolas de Berlim

riem-se para mim

em doce apelo

na sua loquaz afasia de riso amarelo

de língua de fora

 

Entro

de pronto

sem mais demora

 

Já ela me espera impaciente

sentada a um canto

com os lábios de amora pintados de chocolate quente

 

Oh, que doce encanto!

 

De pronto os meus olhos se banham na água mineral natural cristalina
que brota dos seus olhos verdes de menina
que verte da garrafa que traz na alma
sem rótulo
nem trade mark

Ainda de pé

sem me sentar

peço um café

e um croquete de camarão

Ela

coquete

lê de imediato o poema prometido
sem ritmo nem sentido

abstrato

que escreveu para minha apreciação


Versos que me mordem o coração

embora com delicadeza

mas é a arte poética

que se parte patética

com tamanha falta de vocação

à parte tanta beleza

 

Fico feliz

ainda assim

com o poema dela que de si nada diz

nem sequer daquela mulher de formusura

 

Percebi

por fim

encantado

que ela a mim me votava uma amor doce

a que eu desalmado respondi

com o presente poema agridoce

que só gora

muito embora

lhe dedico com doçura

 

Mirandela, quinta-feira, 28 de Janeiro de 2010

Henrique António Pedro