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segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Vejo-me nos seus olhos e ela nos meus se vê


Eu vejo-me nos seus olhos

e nos meus

ela

a si

se vê

 

Melhor assim ela a mim se mostra

e se denuncia

e melhor eu a ela a vejo

e com mais blandícia a desejo

 

Ela vê-se nos meus olhos

e nos seus

eu

a mim

me vejo

 

Melhor assim eu a ela me mostro

e me denuncio

e melhor ela a mim me vê

e com mais meiguice me deseja

 

Vejo-me nos seus olhos

 

Ela nos meus se vê

 

Eu vejo nos seus olhos o que a ela lhe vai na alma

e tudo que os seus lábios

e palavras

silenciam

 

Ela vê nos meus olhos o que a mim me vai na alma

e tudo que os meus lábios

e palavras

calam

 

Ouço o seu silêncio

ela ouve o meu

só os corações é que falam

levados nas asas da imaginação

e do vento

sopro

da paixão

 

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 2 de Junho de 2009

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 24 de outubro de 2025

O livro do rosto


Cada rosto é um livro

aberto

ilustrado

calado ou de viva voz

mesmo se de fácies fechado

 

Livro editado por cada um de nós

em que todos menos o próprio

podem ler e ficar a saber

(o que é por vezes impróprio)

se andamos alegres ou tristes

de saúde ou doentes

se estamos na mesma ou mudados

 

Livro em que escrevemos

com sorrisos ou esgares

olhares precisos ou imprecisos

o que nos vai na alma

se angustiados

deslumbrados

em calma ou em dessossego

apaixonados ou em desapego

 

Livro em que publicamos

mesmo sem querer

ou sequer podermos ler

intimidades

mentiras e verdades

sucessos ou desgostos

 

Livro em que nos mostramos por inteiro

não apenas um perfil ligeiro

 

Convém, por isso, cuidar no espírito

o que nos livros dos rostos

trazemos escrito

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 10 de Julho de 2012

Henrique António Pedro

 


terça-feira, 21 de outubro de 2025

Entre Sol e Lua


Já o Sol declina

já a noite se avizinha

e adensa

 

Já espreita a Lua

imensa

por entre as copas do olival

que emoldura a colina

 

No abismo celestial

brilha, por agora, Vénus

disfarçado de estrela

 

Entre Sol e Lua

sobre a Humanidade

paira o halo pesado

abafado

do relativismo moral

 

E a Lua ergue-se silenciosa

esplendorosa

sorrateira

ruborizada

depois que o Sol da verdade se apagou

na Terra inteira

 

Que pecados terá cometido ela

para vir assim envergonhada

se já não há mal algum

se tudo é relativo

permissivo

amoral

interesseiro?

 

Se já nem pecado é matar

seja onde seja

e porque motivo for

se já não há amor verdadeiro

 

Se toda a mentira é agora útil

piedosa

o insulto gratuito

e a ofensa graciosa

num Mundo em que tudo tem preço

e o Bem passou a ser inútil

um adereço

 

A Lua surge assim corada

envergonhada

só da Terra ver

 

Vale de Salgueiro, terça-feira, 27 de Julho de 2010

Henrique António Pedro

sexta-feira, 17 de outubro de 2025

Do prazer de prender e ficar preso


Sentimento tão volúvel como o vento

nuvem fugidia que só ilude

e adia

o sofrimento

 

É o puro prazer de prender e ficar preso

o falso contentamento

a que chamamos paixão

que mais não é que a pura ilusão

de que não nos libertamos

só porque pensamos

que amamos

 

À força de mais desejar do que amar

na trama de suas teias

ao peso de suas cadeias

mais e mais

acabamos por nos amarrar

 

Este puro prazer de prender e de ficar preso

a que se chama paixão

não é liberdade de verdade

não

 

É sim

antes

prisão

 

 

Vale de Salgueiro, segunda-feira, 2 de Março de 2009

Henrique António Pedro

 

domingo, 12 de outubro de 2025

Breve é a vida. Desmedida a Eternidade



Interrogo-me


Porque razão nos deu Deus
tão amplo espaço para morar
onde até o Absoluto podemos imaginar
mas tempo tão curto nos deu para viver?

Porque tão breve é a vida
tão fácil é a vida perder
e tão desmesurada
e decantada é a Eternidade?


Porque intentamos fugir à dúvida

e ao sofrimento

encurtar o espaço e o tempo

iludir a realidade

com a vertigem da velocidade

 e a falácia do pensamento?

 

Se a questão é tão só a verdade

e mais amar

estreitar mais a distância

mais alargar o sentir

aproximar mais os demais

e com eles partilhar

o devir

 

 

Vale de Salgueiro, sexta-feira, 17 de Fevereiro de 2012

Henrique António Pedro

 

sexta-feira, 10 de outubro de 2025

Poeta, demente, reincidente



Com o corpo confinado à Terra

de cabeça

tronco

membros

olhos

ouvidos

e demais sentidos

entregues à Mãe Natureza

 

Deixo que percorram os caminhos que lhes aprouver

animados pela energia telúrica que em leveza os leve

faça sol

chuva

ou neve

 

Enquanto eu

por instantes reduzido a um verso

a um lapso de luz intermitente

ausente

do espaço-tempo

sem sentido

nem vontade

voo no vento

de espírito espraiado por toda a dimensão do Universo

 

Demente

reincidente

só mais tarde caio na realidade

 

Vale de Salgueiro, 2 de Janeiro de 2013

Henrique António Pedro