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domingo, 22 de abril de 2018

Tocam os sinos a sinais




Na minha aldeia
por genuína ideia
ao toque de finados
o povo chama de “sinais”

Sim…ais…
“sinais”
sons
doridos
sofridos
fatais

Que soam nos ouvidos
ecoam nos descampados
e se calam no coração

Dlãoooooooooo
Dlãoooooooooo

Sempre que alguém morre
seja lá quem for
ou qual for a sua condição
os sinos tocam na torre
doridos sons de dor
o toque a “sinais”

Dlimmmmmmm
Dlimmmmmmm

Dlãoooooooooo
Dlãoooooooooo

São sinais!

Sinais de fim
sinais de compaixão
sinais assim…
de…
…adeus

Sinais a Deus
que receba mais
um dos seus
lá nos céus

Dlimmmmmmm
Dlimmmmmmm

Dlãoooooooooo
Dlãoooooooooo


in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016Henrique Pedro)

quarta-feira, 11 de abril de 2018

Que felicidade eu sinto, Santo Deus!




Que felicidade eu sinto, Santo Deus!

Mergulhado no seio da terra
que me viu nascer
e me fez crescer

Terra de onde parti
só para poder ter o prazer
de a ela retornar

Que felicidade eu sinto, Santo Deus!

A inalar o seu ar
a voar nas sensações do seu céu
a furar luras
no quadraçal
como qualquer fera
mero animal

Que felicidade eu sinto, Santo Deus!

A correr que nem corso
transportando poemas no dorso
a esponjar-me
no descampado
emocionado
nas mais felizes recordações

O Infinito longínquo
que não cabe na vista
nem na imaginação
é aqui!

Aqui é o Absoluto próximo
ao alcance da mão
todo
todo
concentrado no meu coração

Que felicidade eu sinto, Santo Deus!

Tanta
que faço da minha vida
uma permanente oração


in Anamnesis (1.ª Edição: Janeiro de 2016)


segunda-feira, 9 de abril de 2018

Horizontes de afecto



São lhanos mas dilatados
Estes horizontes que me cercam

As asas do pardal, da pomba, da andorinha
E de tantas aves de arribação
Os vencem facilmente
Para me povoar a mente
Com revoadas de lembranças
E bicadas de saudade

São horizontes doces
Próximos
Feitos de suaves colinas
De crepúsculos e alvoradas
Abençoadas pela brisa primaveril
Apenas emergindo
A sul
Mesmo ali a dois passos
Quase ao alcance da mão
A montanha azul
Em que foi martirizado Leonardo
E onde a casta Comba
Sua irmã
Continua escondida nas fragas
Ainda marcadas
Segundo as vozes do povo
Pelas ferraduras dos cavalos alfarazes
Dos seus algozes árabes

Montanha que adoro
Como se fosse o meu Monte Sinai
E eu fora Moisés
E que tantas vezes trepo
E “destrepo”
Com a mente e com os pés

Na esperança de que também um dia
Uma sarça-ardente se incendeie
Dentro de mim

In Anamnesis-1.ª Edição: Janeiro de 2016


sexta-feira, 6 de abril de 2018

O problema é que ...



O problema é que …

nem sempre soletramos a palavra paz
em paz
nem a palavra amor
com o amor que ela requer
e à palavra verdade
a interpretamos como melhor nos aprouver

O problema é que …

nem sempre amamos com o coração
quem nos ama
nem apertamos a mão
com a força devida
a quem nos estende a mão amiga
e nem sempre respondemos a quem nos chama
com a necessária prontidão

O problema é que …

apenas vemos problemas nos outros
nunca em nós
e muitas vezes nos isolamos
tentando assim vencer
a nossa própria solidão
sem darmos ouvidos a outra voz

O problema é que …

só damos quando recebemos
sem que nos apercebamos
de que
o egoísmo
é o problema


segunda-feira, 2 de abril de 2018

O cântico dos estorninhos




Em tarde de Outono
chuvoso e morno
um bando de estorninhos
negros
daninhos
canta cânticos histriónicos
pousado nos fios telefónicos
que cruzam o olival

É uma algaraviada jovial
uma sinfonia desafinada
uma balada sem tino
desmiolada

Levantam voo ao menor sinal
em torvelinho
sempre a piar
rodopiam pelo ar
e vão de abalada

Eu
pássaro sem bando
fico só
a cismar
aninhado no meu ninho
por não saber voar

in I Coletânea de Poesia 2017  da ALTM – Academia de Letras de Trás-os-Montes





terça-feira, 27 de março de 2018

As pedras de Pinetum levitam no tempo




As pedras de Pinetum levitam no tempo

 

As pedras de Pinetum levitam no tempo

apenas mudam as paredes

as pontes

as fontes

em que se concertam

os poemas que despertam

e espevitam o sentimento


Pedras alçadas em muralhas

em campos de batalhas

vias, becos e calçadas

bordejadas de mecos

e de etéreos marcos miliários

são a memória da História

 

Deslavadas pelo rio

puídas pelo vento

erguidas em ideia

areia

e cimento

são muros mudos

 

Nada dizem do futuro

próximo ou distante

falam do passado estuante

sombrio

não relatado nos anais


As pedras de Pinetum levitam no tempo

fazem eco

são sinais


Vale de Salgueiro, segunda-feira, 20 de Agosto de 2012

Henrique António Pedro