Cigana parida
na palha espalhada
no chão do curral
mortalha do porco
e cama do cão.
Poalha de humana caridade
de meu tio Daniel:
-Ajuda aqui Inocência
traz o caçoulo da água benta
e uma toalha
que vamos batizá-lo cristão
-Ai Jesus que rapagão
-Que nome lhe vamos por?
E a cigana Santa ri de alegria
e um tudo-nada de dor
- Daniel “comósenhor”!
Fora mulher e seria Inocência
-Então será Daniel como eu!
E que bem-dito seja!
E Daniel Comoeu
cigano livre como o vento
que vindo de Espanha
sopra por toda a Montanha
como eu afilhado
de minha madrinha Inocência
e por meu tio Daniel bento
voa hoje Europa fora
agora com passaporte
de crédito e sorte
derrubando fronteiras uma a uma
sem raias de ignomínia
a salto da fortuna.
Rico como porco defunto
amortalhado na mesma palha
espalhada no chão do curral
quando o frio e a geada
curam o presunto
curtem coiros e carnes
e apuram as almas
deslavadas de mal
In Minha Pátria Montanha (Ver o Verso Edições – Dezembro 2005).
Esta faz-me lembrar uma caldeireira (ou era albardeira?) que bem queria parir nas palhas do chão. do cabanal da minha tia Assunção. Infelizmente não o conseguiu fazer... Fez-se uma subscrição para se arranjar uma camioneta que a levasse ao Hospital. Lá foi na camioneta, Mas no dia seguinte soubémos que tinha morrido sem parir. E o marido caldeireiro (ou albardeiro?) lá seguiu a sua vida pelo mundo com o rancho de filhos que já tinham...
ResponderEliminarNunca me esqueci disto, era eu criança.
Extraordinário poema. Parabéns!
ResponderEliminarAo fazer a sua leitura vi passar pela minha mente um filme.
Caro amigo e Poeta Henrique Pedro, li, com gosto, o seu poema. Foi o título que me levou a lê-lo hoje. Os meus avós maternos eram da aldeia de Talhas. Nos seus currais nasceram dezenas de ciganos. A porta estava sempre aberta. Eles batizaram perto de cem crianças a maioria delas ciganas. A minha mãe, batizou 20 crianças ciganas. Ainda andam por lá afilhados deles. Parabéns Cumprimentos.
ResponderEliminarExcelente!
ResponderEliminarRealidade crua e afecto!
É por aí que deves explorar a tua poesia: vida e afecto.
Abraço
Henrique,
ResponderEliminarAdorei! Este foi especial.
Bj
Nanda
Henrique, o título e a imagem a principio me trouxeram aqui, mas o conteúdo este me fez ficar
ResponderEliminarpoema de inexpressível bom gosto talhado de inteligencia e porque não dizer de uma realidade crua...parabens amigo grande abraço poeta querido beijos na alma
Rosane Silveira